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Alemanha | 150 ativistas e militantes discutem ruptura revolucionária com o Die Linke

No último sábado, cerca de 150 pessoas se reuniram em Berlim para discutir uma perspectiva revolucionária fora do Die Linke.

quinta-feira 19 de janeiro de 2023 | Edição do dia

104 anos após o assassinato de Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht - pouco antes de terem rompido com o SPD para construir o Partido Comunista da Alemanha - uma conferência intitulada "15 anos de Solid e de Die Linke- Qual organização para a luta de classes?" colocou a questão sobre como uma força política revolucionária independente do reformismo pode ser construída na Alemanha. Durante um dia intenso de debates em mesas e cursos, foi enfatizada a necessidade de romper com o Die Linke diante da crise capitalista, da espiral de guerra, do militarismo, da catástrofe climática e de dar passos para a construção de uma organização revolucionária.

Alguns dos presentes tiveram que ficar de pé na sala de reunião da Casa da Democracia, de tão cheia que estava. A conferência marcou a conclusão de uma luta de um mês travada por um grupo de militantes sob o rótulo de “Revolutionärer Bruch" (Rompimento Revolucionário) na ala jovem do Die Linke, Solid. Eles não queriam mais se contentar com as traições da direção do partido e a estratégia do reformismo.

A conferência foi organizada pelo Revolutionärer Bruch junto ao Klasse Gegen Klasse [1], com a participação ativa de vários outros grupos socialistas revolucionários, incluindo a organização juvenil comunista Revolution, o Gruppe Arbeiter:innenmacht (Grupo Poder dos Trabalhadores) e a Revolutionär Sozialistische Organisation (Organização Socialista Revolucionária). Também houveram saudações da Berliner Aktion gegen Arbeitgeberunrecht (Ação de Berlim contra a injustiça patronal), do Funken (IMT) (Fagulha, CMI), da Palästina Spricht (Palestina Fala) e Samidoun, bem como saudações internacionais do Paquistão e das organizações Révolution Permanente e L’Etincelle da França.

A convocação para a conferência enfatizou a resposta completamente insuficiente do Die Linke à crise política do “governo do semáforo” [2]. Porque a Alemanha está se transformando em uma das maiores potências militares do planeta, no contexto de tensões internacionais acirradas, para fazer valer os interesses do capital alemão internacionalmente. Tanto mais urgente é a necessidade, como destaca a declaração final da conferência, de “construir uma juventude revolucionária e anti-imperialista ao lado dos trabalhadores e de todos os oprimidos, que não se conformará com os tambores de guerra imperialistas do “front interno” e da OTAN, nem apoiar lideranças reacionárias como Putin.”

Isso também se reflete em uma militarização interna: nos últimos dias, o governo impulsionou a evacuação de Lützerath com violência policial massiva - o que também revela a hipocrisia do "capitalismo verde". Mas o Die Linke também apoiou a mineração de lignito (tipo de carvão) em Brandemburgo nas últimas décadas.

Por outro lado, é necessária uma alternativa revolucionária visível e credível. Desde que foi fundado, há 15 anos, como partido do governo, o Die Linke é responsável por cortes na educação e saúde, terceirizações, deportações e violência policial. Ele está firmemente integrado ao Estado alemão, como Freddy Hölzer enfatizou na tribuna de abertura, e está estrategicamente orientado para redirecionar a luta de classes e as lutas em geral para o parlamento: "É por isso que temos que romper com o Die Linke não apenas organizacionalmente, mas também com sua estratégia. No final, Freddy disse: “Precisamos de uma força socialista revolucionária que lute por nossos interesses como trabalhadores, jovens, oprimidos e com quem possamos finalmente fazer uma revolução. Para isso queremos construir uma juventude revolucionária, que dê as costas ao reformismo.”

O reformismo é um fenômeno internacional e a conferência discutiu as experiências do Podemos na Espanha e do Syriza na Grécia. Mas também foi debatido o Novo Partido Anticapitalista (NPA), com a presença, entre outros, de um jovem membro da nova organização Révolution Permanente na França , que explicou porque não basta a unidade de todos os anticapitalistas sem consenso estratégico.

Nesse sentido, Tabea Winter, da Revolutionären Internationalistischen Organisation (Organização Internacionalista Revolucionária (RIO)), que edita o Klasse Gegen Klasse, enfatizou em seu discurso de abertura:

“Construir uma força material com essa perspectiva significa lutar por um partido revolucionário enraizado na luta de classes - um partido de combate leninista internacional. Para isso é necessário romper organizativa e estrategicamente com o reformismo e começar hoje as tarefas preparatórias: vincular-se à vanguarda da classe trabalhadora e da juventude, fundir-se com suas partes mais progressistas e em lutas comuns um programa contra o governo e o capital imperialista , bem como contra os mediadores como os partidos reformistas e as burocracias dos sindicatos e ONGs.”

Até 150 pessoas de diferentes setores da esquerda alemã, incluindo muitos trabalhadores, concordaram. Em sua saudação no início da conferência, a parteira Charlotte falou sobre a situação na sala de parto de Neuperlach, onde ela trabalha. Esse que provavelmente deve ser fechado como parte do “corte de gastos” em saúde. Junto a seus colegas e muitos apoiadores, eles lutam pela preservação da sala de parto e pela auto-organização dos trabalhadores.

Também estiveram presentes alguns grupos de esquerda ao lado da Organização Revolucionária Internacionalista [3]. Assim, o grupo Arbeiter:innenmacht com a organização juvenil Revolution, a RSO e camaradas individuais do Die Linke.SDS, [4] o Funken, a Ação de Berlim contra a injustiça patronal e o Palästina Spricht. Foi um debate animado e solidário com diferentes posições, o que é raro na esquerda alemã.

Após uma série de cursos sobre uma ampla gama de temas como crise e inflação, reformismo e burocracia, sindicatos, catástrofe climática, feminismo, juventude, imperialismo e internacionalismo, a sessão final da conferência concentrou-se na adoção de uma declaração final com dois objetivos: por um lado, esclarecer se a ruptura com o Die Linke deve ser concluída e, por outro lado, acordar campanhas conjuntas para todas as organizações e participantes presentes nos próximos meses.

Uma questão em particular se destacou no debate: devemos continuar votando no Die Linke? Porque haverá eleições em Berlim em apenas um mês. O Die Linke luta para permanecer no governo, renovando sua coalizão com os social-democratas e os verdes. Alguns participantes, liderados pelo grupo Arbeiter:innenmacht com a organização juvenil Revolution, apelaram a um apoio eleitoral crítico aos candidatos do Die Linke, que “se posicionam de forma credível contra a participação do seu partido no governo a nível estadual e federal”. Mas a maioria da fração Revolutionärer Bruch e RIO/Klasse Gegen Klasse argumentou que uma clara linha divisória e independência política do Die Linke e suas políticas de governo são necessárias. Então Lea e Inés, assistentes sociais em Berlim, fizeram o questionamento: Como se pode fazer um chamado ao voto no Die Linke, que deporta jovens migrantes e faz cortes massivos no sistema educacional?

Portanto, fazer campanha pelo voto nulo e por uma nova alternativa para a classe trabalhadora seria a melhor forma de angariar apoio. A perspectiva é de dar passos para a construção de uma frente política de intervenção conjunta na luta de classes e também nas eleições, a partir de uma perspectiva clara de independência da classe trabalhadora e de luta por um governo operário.

Dois camaradas independentes e o grupo Arbeiter:innenmacht com a organização juvenil Revolution apresentaram uma declaração final alternativa. Após uma longa discussão, porém, prevaleceu por larga maioria a proposta que chamava ao rompimento com o Die Linke e uma política concreta comum entre os presentes.

No final, dois terços da conferência votaram a favor desta declaração, que anunciou uma ruptura imediata com o partido Die Linke e também recusou qualquer apoio eleitoral à coligação vermelho-vermelho-verde (SPD, Die Linke e Partido Verde). Ao mesmo tempo, a declaração final enfatiza a necessidade de continuar a discussão estratégica entre todos os presentes e testar o acordo na prática comum. Para esse fim, foi definida toda uma série de campanhas conjuntas, que serão concretizadas nas próximas semanas:

  • Intervir na próxima rodada de negociação coletiva do serviço público (TVöD) com um programa que eleve a demanda por compensação salarial real da inflação e a combine com um programa mais amplo contra a crise, a guerra e a catástrofe climática; construir a campanha ver.di em torno da rodada TVöD, intervir junto com o VKG nos grupos operacionais, e sob isso, organizar manifestações políticas em dias de greve que levantem tal programa:
  • Reajuste conforme a inflação para todos, ajuste de todos os benefícios sociais de acordo com a inflação, promulgação de um congelamento de aluguel, aplicação do DWE.
  • Bilhões em investimentos em saúde, educação e clima em vez de 100 bilhões em armamento, introdução de impostos e taxas sobre a riqueza,
  • Socialização do fornecimento de energia sob controle democrático dos trabalhadores e da população,
  • Contra a violência racista contra nossos colegas com experiências de fuga e migração e por vistos de trabalho e estudo para todos, fim em todas as deportações.
  • Solidariedade com os sindicatos e trabalhadores de outros países que sofrem com a crise e a guerra. Solidariedade internacional entre trabalhadores que sofrem sanções mútuas.
  • Apoiar a auto-organização dos trabalhadores em todas as lutas, como a atual luta das parteiras em Neuperlach contra o fechamento de sua sala de parto.
  • Começando pela resistência em Lützerath, intervir no movimento climático com um programa socialista e preparar iniciativas no movimento operário para mostrar a classe trabalhadora como sujeito político na luta contra a catástrofe climática e uma economia planificada democrática e ecológica.
  • Participar de todas as mobilizações contra o racismo de Estado, violência policial, deportações e extrema-direita/fascista. Em todos os lugares, especialmente contra a atual estigmatização racista da juventude migrante.
  • Participar das mobilizações em torno do 8 de março, atuar nas ações grevistas que acontecem nesse dia em todo o país por diferentes movimentos com esse programa feminista.
  • Se juntar a todas as futuras mobilizações contra a militarização e a guerra, com uma perspectiva de solidariedade internacional da classe trabalhadora contra a agressão dos governos capitalistas, pela necessidade da luta da classe trabalhadora na Alemanha contra seu governo imperialista.
  • Participar nas mobilizações contra o colonialismo, com uma solidariedade incondicional com a luta e pela libertação dos povos colonizados, como no Curdistão e na Palestina, que são combatidos pelo Estado alemão em particular. Defendemos a descriminalização de suas organizações de resistência e o fim de todas as entregas de armas alemãs à Turquia, Israel e outros países.
  • Tendo em vista a traição do Die Linke ao referendo sobre a Deutsche Wohnen und Co. [5], as milhares de deportações, a expansão do aparato policial racista, osnovos cortes na saúde e educação, etc., rejeitamos o apoio eleitoral ao Die Linke na repetição das eleições da Câmara dos Deputados. [6] Por outro lado, enfatizamos a necessidade de candidaturas socialistas revolucionárias fora dos partidos reformistas, organizando uma campanha junto com todos os interessados ​​contra a renovada participação governamental do Die Linke na RRG e defendemos uma nova mobilização para a expropriação dos grandes grupos imobiliários.

A declaração final encerra com o apelo:

“tomar medidas para construir, em unidade, uma frente revolucionária. Essa frente deve ser baseada em experiências compartilhadas de luta de classes e intervenção política em greves, lutas sociais e, futuramente, eleições em nível municipal, estadual e federal. Com base nas lições das experiências de Karl Liebknecht e Rosa Luxemburgo, acreditamos que uma ruptura entre os revolucionários e os administradores social-democratas do capitalismo não é apenas necessária, mas inevitável.”

Todos aqueles que já hoje querem se organizar nesta perspetiva, Tabea Winter convidou na conclusão do Klasse Gegen Klasse:

“Queremos continuar a nos organizar com todos aqueles que querem construir junto conosco uma organização revolucionária com definições estratégicos claras, sem ilusões no reformismo e sem ilusões nos partidos "amplos" anticapitalistas. Queremos construir uma corrente nas universidades que se veja como claramente revolucionária, antiimperialista, antimilitarista, antirracista, feminista, socialista e que considere a unidade com a classe trabalhadora uma questão estratégica central. Queremos construir uma corrente nas fábricas que represente um programa de hegemonia da classe trabalhadora sobre todos os oprimidos, se organize independentemente do capital e do estado, mas também das burocracias, e que queira construir facções revolucionárias e antiburocráticas nos sindicatos.”

No dia seguinte, milhares de pessoas foram às ruas para homenagear Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht. Cerca de 100 pessoas aderiram ao bloco do Revolutionärer Bruch com uma faixa que exigia “Nem um centavo ao militarismo”, uma antiga e ao mesmo tempo atual palavra de ordem do movimento socialista revolucionário na Alemanha.


[1Jornal alemão da Rede Internacional de Diários do qual o Esquerda Diário é parte, em 14 países e 7 idiomas. NdT

[2Trata-se de coalizões da social-democracia/socialistas, de partidos liberais e do Partido Verde. NdT

[3Impulsionadora do Klasse Gegen Klasse. NdT

[4Juventude estudantil do Die Linke. NdT

[5Trata se de um plebiscito feito em Berlim que votou a expropriação de grandes imobiliárias. NdT

[6Em Berlim, as eleições estão sendo refeitas por conta de uma falha na última contagem. NdT





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