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Vaticano | Bento XVI, o papa que tinha como principal inimigo o marxismo

Durante seu papado publicou três encíclicas, em duas se referia a Marx e o marxismo. Nada mais nada menos Bolsonaro ao se referir sobre a morte exaltou suas críticas contra o marxismo. Francisco, o atual papa, publicou em 2018 um livro do emérito no qual concordou com suas críticas ao ateísmo marxista. Também apontou contra a ideologia de gênero e as opiniões de Niezsche sobre o cristianismo.

quarta-feira 4 de janeiro de 2023 | Edição do dia

Joseph Ratzinger foi um dos teóricos mais importantes da igreja católica, apostólica e romana. Foi o braço teórico e alma gêmea de João Paulo II, o papa que junto a Gorbachov, Reagan e Thatcher nos anos 80 empreenderam a ofensiva do capitalismo contra as massas no mundo, comumente chamada de neoliberalismo ou também restauração burguesa, que provocou a queda da URSS. Ainda hoje estamos vivendo as consequências daquela derrota.

Em seu período como teórico assessor de João Paulo II, foi quem idealizou e preparou o perdão a Galileu Galilei pela condenação que a Igreja Católica lhe aplicou, mantendo ao mesmo tempo o princípio implacável de que a igreja sobre a infalibilidade do papa, ou seja, nunca está errado.

Sobre a caridade e o sexo

Ratzinger assumiu seu papado em abril de 2005 com o nome de Bento XVI. A primeira Carta Enciclica foi “sobre o amor cristão”. Deus caritas est, publicada no natal desse mesmo ano, onde falava de eros, o sexo e a caridade. As encíclicas são consideradas as diretrizes principais dos governos papeis no Vaticano.

Nessa encíclica, ataca contra o marxismo por este rechaçar a caridade da igreja, por denunciar que seus objetivos é conter e manter a pobreza ao invés de fazer justiça.

Disse Bento XVI que “os tempos modernos, sobre tudo desde o século XIX, estão dominados por uma filosofia de progresso com diversas variantes, cuja forma mais radical é o marxismo” e se poderia dizer que é sim. Mas logo se refere que o marxismo promove uma espécie de teoria de “quanto pior melhor”, em uma suposta “teoria do empobrecimento” que manteria nas massas pobres um potencial revolucionário, e que este seria a origem do rechaço e ataque a caridade. E termina afirmando que “a verdade é que não se pode promover a humanização do mundo renunciando, por ora, a se comportar de maneira humana”

A caridade da igreja não é a solidariedade habitual entre trabalhadores e o povo pobre, como quando se luta contra as injustiças, as demissões nas empresas e o desemprego, contra as mortes por assassinato policial (“gatilho fácil”) e a repressão do estado. Não é nada habitual ver a instituição eclesiástica na primeira fila defendendo as vítimas do estado ou dos empresários, como indicaria um espirito cristão. No entanto, pelo contrário, o marxismo revolucionário tem como esse fundamento a solidariedade entre os explorados e oprimidos, e a participação na luta de classes como motor para abrir um caminho para a emancipação dos trabalhadores que efetivamente poderá terminar com a pobreza.

O papel do Vaticano nas guerras sempre esteve muito afastado de qualquer caridade humanitária. Como um exemplo na América Latina, de um tempo muito próximo a Ratzinger, durante a guerra com a Inglaterra pelas ilhas Malvinas, João Paulo II foi a Argentina não para se solidarizar com a nação oprimida, mas para que se entregasse ao imperialismo inglês.

Outro dos temas da encíclica é o eros e o sexo, relacionados claramente com as terríveis denúncias a igreja sobre os abusos sexuais e que se agudizaram durante o mandato de Bento XVI. Essas milhares de denúncias levaram a setores cristãos a questionarem o celibato sacerdotal, que impede o casamento dos padres e os obriga a contenção sexual. Nesse sentido, aquela inciclica foi uma defesa do papa ao celibato.

Bento XVI disse que o “cristianismo, segundo Friedrich Nietzsche, teria dado de beber a eros um veneno, no qual, embora não levasse a morte, faria degenerar em vicio” (do texto Além do bem e do mal). E acrescenta que “ O filosofo alemão expressou desse modo uma apreciação muito difundida: a igreja, com seus preceitos e proibições, por um acaso não transforma em amargo o mais belo da vida? Não coloca quiçá cartazes de proibições precisamente ali onde há alegria predisposta em nós pelo Criador, nos oferece uma felicidade que nos faz saborear algo divino?”

A advertência consistiria que os abusos sexuais na igreja tem sua origem no celibato sacerdotal então teriam que dar razão a Nietzsche e sua frase citada, onde afirma que a origem do mal estaria no próprio cristianismo e suas restrições ao sexo e isso afetaria irremediavelmente a igreja católica. No começo desse ano, realizou-se um simpósio no Vaticano que colocou o celibato em debate e produziu a reação dos conservadores liderados pelos mais fieis a Bento XVI. Em outubro de 2023 continuará com o chamado a um Sínodo dos Sínodos, que convocará em Roma os bispos de todo o mundo e se reabrirá as discussões.

Em particular, em relação a “ideologia de gênero”, a igreja católica sempre condenou a homossexualidade, mas Bento XVI foi muito mais além e impulsionou uma verdadeira cruzada contra os direitos civis da população LGBT. Também fez campanha contra o preservativo na Africa, o que contribuiu com a epidemia de HIV.

Sobre a salvação e a esperança

Na encíclica de 2007, Spe Salvi, Bento XVI fez importantes reconhecimentos ao pensamento de Marx para logo criticar seu materialismo. Disse que “depois da revolução burguesa de 1789 havia chegado a hora de uma nova revolução, a proletária: o progresso não podia avançar simplesmente de modo linear a pequenos passos. Fazia falta um salto revolucionário. Karl Marx reconheceu essa chamada do momento e, como vigor de linguagem e pensamento, tratou de canalizar este novo e, como ele chamava, definitivo grande passo da história rumo a salvação, fez o que Kant havia qualificado como o “reino de Deus”. E acrescenta que “ [...] Marx havia escrito a situação de seu tempo e havia ilustrado com grande capacidade analítica os caminhos até a revolução, e não só teoricamente: com o partido comunista, nascido do manifesto de 1848, deu início também concretamente a revolução. Sua promessa, graças a precisão de sua análise e a clara indicação dos instrumentos para a mudança radical, fascinou e fascina ainda hoje.

Ele crítica Marx que tenha esquecido a liberdade do homem, crendo que isso alcançava com a solução dos problemas econômicos. “Seu verdadeiro erro”, disse Bento XVI, “é o materialismo: de fato, o homem não é somente o produto das condições econômicas e não é possível curá-lo somente desde fora criando condições econômicas favoráveis”.

Em primeiro lugar, Marx não disse que o homem seja só produto de suas condições econômicas. Mas também que a eliminação do poder de forças sociais alienantes, as relações de produção baseadas na exploração, abrem a possibilidade de que o homem através de sua autodeterminação seja quem controle seu próprio destino, podendo avançar na liberdade entendida em termos coletivos.

Em segundo lugar, as experiências da URSS e os chamados “socialismos reais”, que de reais tem pouco, estiveram limitadas a falta de desenvolvimento da revolução socialista a nível mundial, que permitiu o surgimento do stalinismo e a burocracia desses estados. Sobre esses processos, os escritos do revolucionário Leon Trotsky são os mais certeiros.

O mesmo Ratzinger no ano de 1996, depois da queda da URSS, no documento Sobre a situação atual da fé e a teologia vendo que avançava a pobreza, a opressão e toda classe de dominações injustas, afirma que “me parece provável que o futuro se faça presente novas formas de concepção marxista do mundo”.

A luta pelo socialismo segue presente como necessidade de superar as condições atuais do capitalismo. Uma sociedade organizada segundo a conhecida formula do Manifesto Comunista “De cada qual segundo suas capacidades, a cada qual segundo suas necessidades”. As duas proposições, indissoluvelmente ligadas, indicam que o trabalho deverá ser coercitivo, e também será segundo a capacidade, os meios físicos e psíquicos. Sem que exista violência alguma, os membros da comunidade, aproveitando de uma técnica elevada, fornecerão suficientemente os estoques da sociedade para que cada um se prove amplamente “segundo suas necessidades” sem controle humilhante. A formula do comunismo, bilateral mas indivisível, supõe a abundancia, a liberdade e o desenvolvimento das personalidades ( extraído de Leon Trrotsky, A revolução Traída).




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