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EUA: os sindicatos frente ao novo Governo de Joe Biden

Jimena Vergara

Jason Koslowski

EUA: os sindicatos frente ao novo Governo de Joe Biden

Jimena Vergara

Jason Koslowski

[De Nova York] A invasão do Capitólio mostrou a crescente ameaça da extrema direita, porém legitimou o governo que inicia. É urgente organizar as forças da classe trabalhadora para lutar contra o governo democrata de Joe Biden. Apesar das promessas de estímulo, o novo governo é o representante do regime bipartidário que vem levando adiante o ataque capitalista contra a classe trabalhadora, sobre o emprego, a saúde e o direito à moradia. Os sindicatos serão chave para lutar tanto contra o racismo e a ultradireita como contra os planos capitalistas.

O assalto ao Capitólio fez balançar a transição presidencial pacífica tão esperada pela classe dominante estadunidense. Plenamente consciente de que o que estava em jogo era a já erodida legitimidade da democracia estadunidense, o Estado imperialista atuou em resposta para conter a ameaça trumpista (por ora). Tudo isso apesar da gentil recepção que a horda ultradireitista recebeu no Capitólio por parte de membros da polícia e da guarda nacional, e da hipocrisia da classe dominante que durante quatro anos apoiou o racismo rampante de Donald Trump porque estava satisfeita com os lucros exorbitantes gerados durante seu mandato e mais tarde durante a pandemia.

O novo presidente conseguiu juntar atrás de si uma fortuita unidade burguesa que permitiu que Biden desse seu discurso de investidura, em 20 de janeiro, sem maiores sobressaltos, em um Capitólio rodeado pela Guarda Nacional. No entanto, uma vez que Trump tenha sido derrotado conjunturalmente, a unidade neoliberal de Joe Biden parece impossível. A nova administração chega ao poder com pouca legitimidade, já que milhões de pessoas consideram que a eleição foi fraudulenta, e com a classe dirigente dividida enquanto a o que fazer no imediato para aliviar os efeitos sanitários e econômicos da pandemia. Biden ofereceu um pacote de ajuda de 1,9 bilhões de dólares que implica em colocar dinheiro diretamente nos bolsos da classe trabalhadora e em algumas concessões como aumentar o salário mínimo nacional para 15 dólares, de forma gradual. Wall Street, os republicanos e um setor do establishment democrata estão contra essas medidas, querem um resgate aos moldes das corporações e dos grandes capitalistas. Wall Street e o establishment bipartidário se opõem a um plano de ajuda que injete efetivo direto nas famílias operárias por um lado e que estipule o salário mínimo em 15 dólares a nível federal.

Com o pacote de auxílio, o novo presidente pretende responder a sua base social e garantir alguns meses de “lua de mel” com o novo governo, mas não apenas. Biden e um setor do capital são amigáveis com a ideia de despender recursos massivos para, por um lado, amenizar as consequências da crise sanitária e econômica, e evitar as próximas convulsões sociais; por outro lado, alimentar o consumo que espera-se que possa dinamizar a decadente economia até inícios da primavera boreal. Esse último setor navega com a ideia de que é preciso pressionar um pouco mais que o normal o capital hegemônico para conseguir um acordo cujo resultado seja balanceado de acordo com a relação de forças mais geral. Como disse o economista Paul Krugman:

A estreita margem democrata no Congresso significa que os objetivos progressistas mais ambiciosos terão que ser suspensos. Porém, o pacote de resgate que Biden apresentou na quarta-feira já indica que não mostrará a excessiva cautela que inibiu a resposta do presidente Barack Obama à crise econômica.

Do lado “progressista”, estão também as direções sindicais que formaram parte da coalizão que deu a Biden a presidência e que vêem uma oportunidade para acertar alguns dos aspectos mais draconianos das leis anti-sindicais dos Estados Unidos e retomarem o prestígio diante da sua base. Como colocam os redatores do Wall Street Journal:

Os sindicatos pedem ao presidente Biden que se apresse em cumprir sua promessa de campanha de defender os direitos dos trabalhadores e das organizações sindicais, entre outras coisas, impulsionando leis que reforcem os esforços de sindicalização.

A administração Biden também está pressionada pela dissidência dentro de seu próprio partido, encabeçada por Bernie Sanders e o Squad [1]. É que o mandato de Joe Biden e Kamala Harris se inicia em um contexto onde setores das grandes massas o consideram ilegítimo, e setores celebram que os quatro anos de mandato de Donald Trump chegaram ao fim e estão sedentos de reformas com a ilusão de que o novo governo possa implementar medidas concretas contra a violência policial racista e avançar nas demandas da classe trabalhadora: direito à sindicalização, salário mínimo nacional, Medicare para todos, perdão da dívida estudantil, etc.

O movimento operário estadunidense vem de muito atraso, politicamente e no terreno da organização, como produto da ofensiva neoliberal que diminui drasticamente os níveis de sindicalização, generalizou o trabalho precário e empurrou milhares de trabalhadores à exploração sem precedentes da força de trabalho sem benefícios básicos como o direito à saúde. O BLM injetou energia em setores da classe trabalhadora que, embora não interviram a nível nacional e de maneira generalizada com suas organizações em apoio ao movimento, protagonizaram ações significativas como a greve dos estivadores da Costa Oeste no ápice do movimento contra a violência policial racista.

À contracorrente da passividade das décadas prévias, durante os últimos anos, essa classe trabalhadora, dividida entre sindicalizados e não sindicalizados, entre cidadãos, trabalhadores legalizados mas sem residência e trabalhadores sem documentos, e dividida também por profundas barreiras raciais, começou a despertar. É possível hipotetizar que, produto das profundas ilusões e grandes aspirações em melhorar suas condições de existência, batalhões do proletariado comecem a lutar com a expectativa de poder arrancar do novo governo o que parecia impossível com Donald Trump no poder. Isso se mostra como uma tendência com a conquista de sindicatos na Google, na Amazon no estado do Alabama e em centenas de lutas isoladas em todo o país por reivindicações econômicas, como a recente greve dos trabalhadores do Point Market em Nova York, exigindo aumento salarial de um dólar e um plano de saúde acessível, que tem recebido grande atenção midiática e está prestes a alcançar um acordo com o governo da cidade. Também é possível prever que o BLM volte à cena política e injete energia na classe trabalhadora para voltar a colocar a luta antirracista em primeiro plano. Se essas tendências se desenvolvem, abre-se uma grande oportunidade para uma tarefa fundamental nos EUA: reorganizar o movimento operário de forma combativa e buscar de todas as formas unir as fileiras do povo trabalhador em uma resposta unificada contra o racismo e o capitalismo.

O momento de organizar as forças da nossa classe para lutar contra Biden

No momento, a classe dominante tem depositado suas expectativas em Joe Biden e no Partido Democrata para garantir a estabilidade capitalista a curto prazo. O “partido dos burros” que tem em suas mãos o controle do executivo e das duas câmaras é um partido imperialista financiado pela classe dominante. Por exemplo, Joe Biden tinha, de longe, muito mais patrocinadores multimilionários que Trump nas últimas eleições, e Biden está enchendo seu gabinete com gente ad hoc para manter boiando o barco capitalista. Isso significa que Biden - que herdará uma grande crise econômica - terá que garantir no curto prazo que sejam a classe trabalhadora e os oprimidos, e não os capitalistas, os que pagarão pela crise. Já estamos vendo como os planos de ajuste estão se impondo a nível estatal e local, cidades como Nova York já estão aprovando orçamentos de austeridade, cortando recursos dos serviços públicos como o transporte e a educação. Retendo até 20% do financiamento estatal, provocando demissões massivas de funcionários públicos e reduzindo os serviços sociais.

Ou seja, a situação estrutural das massas trabalhadoras no médio prazo, mesmo que se aplique o plano de Biden integralmente, não será profundamente modificada. A oferta inicial de Biden de mais auxílios federais contra o desemprego é de 400 dólares semanais, apenas pouco mais do que já existe atualmente. E a promessa de Biden de pagamentos diretos de 2.000 dólares a indivíduos foi deixada de lado por uma oferta inicial inferior de 1.400 dólares. A nova administração acaba de anunciar que o auxílio de 1.400 dólares, caso aprovado, será efetivado até março, o que supõe uma bofetada na classe trabalhadora que está batalhando para pagar suas dívidas agora mesmo.

Os trabalhadores se enfrentam com um elevado desemprego e com uma economia que perdeu mais postos de trabalho em dezembro de 2020, enquanto cerca de 40 milhões de pessoas enfrentam a ameaça de despejo. O auxílio federal aos estados parece ser muito menor que o necessário para evitar a perda massiva de arrecadação fiscal que os fechamentos da pandemia trouxeram consigo.

De fato, como destaca o economista Michael Roberts, o principal problema que sacode a economia é a falta de novos investimentos por parte dos capitalistas, e isso se deve à baixa rentabilidade, ou retorno do investimento. A economia estadunidense já se dirigia a uma recessão antes da chegada da pandemia. Tirar a economia da crise de maneira sustentável no tempo significaria superar esse problema. O estímulo de Biden não supera; só aborda algumas das crescentes dívidas dos indivíduos e dos estados. Os capitalistas exigirão, com cada vez mais força, que os trabalhadores paguem a recuperação.

Algo similar aconteceu na última vez que Biden esteve em um cargo público. Depois da crise de 2008, o governo de Obama aprovou uma lei de estímulo que ajudou a resgatar algumas das empresas capitalistas, mas foi muito pequena para impedir a recessão. A isso se seguiu inevitavelmente uma dura austeridade, “um círculo vicioso de duros cortes nos governos estatais e locais”.

Enquanto isso, Biden prometeu defender a aprovação da “Protect the Right to Organize (PRO) Act”, que contém proteções para os trabalhadores e sindicatos. Mas a história mostra algo muito diferente. Há mais de uma década, Obama e Biden se apresentaram com a promessa de aprovar outra lei pró-sindical, a Lei de Livre Eleição do Empregado, e os líderes sindicais se prontificaram para ajudar a campanha de Obama. Então, quando Obama obteve o controle democrata da Câmara e do Senado, simplesmente colocou a legislação em uma gaveta. Em um contexto ainda mais crítico para o capitalismo, devido à incerteza econômica qualquer ampliação dos direitos sindicais terá que ser conquistada e arrancada do governo pelos métodos da luta de classes, não confiando nas negociações palacianas dos de cima. Se a nova administração democrata avançará em medidas de corte mais “progressista”, no médio prazo ou não, é uma pergunta ainda aberta: dependerá dos ritmos da crise econômica e do desenvolvimento da luta de classes.

E não podemos nos esquecer que nesse verão passado, durante o maior movimento social da história dos Estados Unidos contra a polícia racista, foram os prefeitos e governadores do Partido Democrata os que contra-atacaram de forma tão selvagem. Logo após reprimir violentamente a vanguarda, os democratas conseguiram desviar o movimento em direção ao voto em Biden como mal menor, um arquiteto do encarceramento massivo de negros que rechaça todos os chamados para desfinanciar a polícia. Na verdade, o Wall Street Journal acaba de publicar um artigo de opinião do chefe do sindicato da polícia, que se entusiasma com a brilhante eleição de Biden para dirigir o Departamento de Segurança Nacional.

Os acontecimentos no Capitólio dão aos democratas a oportunidade de se apresentarem como “defensores da democracia” e avançar ao mesmo tempo com sua agenda de “lei e ordem”, fazendo aprovar medidas preventivas contra o “extremismo” que, com a desculpa de combater a direita, se voltarão contra as massas, como a antidemocrática lei contra o terrorismo doméstico anunciada pelo novo governo. Isso significa ainda mais recursos para a polícia e as forças federais, que eventualmente irão contra as organizações operárias, o BLM e a esquerda.

Tudo isso significa que só a potente unidade dos explorados e oprimidos nas ruas pode levantar nossas demandas e levá-las até o final, enquanto o regime bipartidário se prepara para preservar o substancial da opressão e exploração aos trabalhadores e minorias raciais nos Estados Unidos, ora outorgando concessões, ora avançando em descarregar a crise sobre as massas trabalhadoras.

Os sindicatos contra Biden e contra a extrema direita

Se quisermos derrotar não apenas a crescente extrema direita, mas também os ataques dirigidos pelos democratas, então a classe trabalhadora deve liderar o caminho, usando suas organizações e seus métodos de luta.

Os trabalhadores ocupam um lugar estratégico crucial no capitalismo. A classe dominante nos Estados Unidos vive dos benefícios derivados da exploração dos trabalhadores em nível nacional e da espoliação dos povos oprimidos em nível global. Nós, os trabalhadores dos Estados Unidos e do mundo, somos os que produzimos todos os bens de consumo, viramos os hambúrgueres, dirigimos os caminhões nas cidades, vilas e rotas de transporte, entregamos a comida e garantimos o funcionamento de hospitais lotados em uma pandemia. A pandemia nos lembrou vigorosamente desse fato. Quando a economia paralisou - e os trabalhadores não puderam trabalhar porque seus locais de trabalho estavam fechados ou as pessoas estavam muito doentes - os patrões descobriram de repente o quão "essenciais" que somos para seus benefícios e pagaram por anúncios e mensagens publicitárias para “nos homenagear”. A sede capitalista de lucro, em tempos de "paz" e em tempos de crise, é a razão do pânico da patronal - junto com democratas e republicanos - para nos obrigar a voltar ao trabalho, razão de nos pressionarem pelo mínimo de dinheiro que pudermos, o mais rápido que pudermos, por todo o tempo que pudermos.

E os sindicatos em particular são cruciais para manter a classe trabalhadora nas rédeas ou para a luta de classes dos trabalhadores. São a forma elementar que assume a luta dos trabalhadores no capitalismo, uma forma de nos defendermos do desejo implacável de espremer nossa energia vital e transformá-la em lucro capitalista. E é por isso que são um lugar onde os trabalhadores aprendem algumas das lições básicas da luta de classes contra a patronal.

É verdade que o número de pessoas filiadas a sindicatos é baixo, apenas 10% de todos os trabalhadores nos Estados Unidos. No entanto, os sindicatos ocupam alguns dos principais "pontos de estrangulamento" do capitalismo, especialmente em uma pandemia. O transporte público é altamente sindicalizado e a chave para levar os trabalhadores para e de volta de seus empregos Os professores são altamente sindicalizados, e o Wall Street Journal, Trump e Biden estão exigindo a reabertura de escolas em más condições sanitárias. As enfermeiras também apresentam taxas de sindicalização mais altas - e são cruciais para gerenciar o desastre de saúde pública do COVID-19. E temos visto alguns sinais de retomada da luta sindical nos últimos anos, desde a massiva greve de professores na Virgínia Ocidental em 2018, e nas greves de trabalhadores agrícolas em 2020 e no novo sindicato de trabalhadores de tecnologia da Google.

Tudo isso coloca os sindicatos em uma posição chave nos próximos anos. Os democratas e capitalistas não podem nos salvar da extrema direita, mas os sindicatos têm armas cruciais em suas mãos. Quando Trump ameaçou atrapalhar a eleição de 2020, a central AFL-CIO de Rochester convocou uma greve geral para resistir em uma eleição impugnada, e ecoou por vários outros sindicatos, incluindo o nacional United Electrical Workers. Durante a revolta do BLM no verão, os sindicatos desempenharam um papel fundamental, com alguns motoristas de ônibus da MTA se recusando a transportar policiais para ajudar a conter os protestos. O envolvimento do sindicato influenciou os cortes de fundos para alguns departamentos de polícia, uma das pernas do apoio da extrema direita.

As greves podem construir e mostrar solidariedade entre sindicalistas e ativistas antirracistas, e podem ser cruciais para isolar, intimidar e rejeitar a violência de extrema direita, bem como lutar pela prisão de policiais responsáveis ​​por assassinatos racistas., Denunciando como o Estado investe milhões nas Delegacias de Polícia enquanto não há dinheiro para saúde ou educação.

Mas o mais importante, precisamos de sindicatos militantes e combativos dispostos a lutar contra nosso principal inimigo nos próximos anos: o novo governo de Joe Biden e Kamala Harris. Independentemente das migalhas jogadas em nós, a classe trabalhadora tem que estar preparada para lutar contra os planos de austeridade que estão por vir e para ganhar cada uma das reivindicações dessa classe trabalhadora que agora está votando em Biden. Ou seja, temos que nos preparar para ir mais além quando possível e defender o que conquistamos quando necessário.

Uma frente única da classe trabalhadora

No entanto, os líderes sindicais costumam atrapalhar. Frequentemente eles são cães de estimação do Partido Democrata. Desde a década de 1980, os líderes sindicais optaram amplamente por uma abordagem de "colaboração de classes". Aceitam minimizar a luta de classes no trabalho ou são cúmplices diretos do ataque dos patrões. Para melhorar as condições de trabalho, eles pressionam o Partido Democrata para aprovar novas leis. O resultado tem sido a estagnação dos salários e o constante desmantelamento de sindicatos, juntamente com baixas recordes de ação militante. Não é por acaso que nesses anos houve uma queda acentuada no número de greves, com um número muito menor nos últimos anos que em qualquer outro momento desde que começaram a ser registradas estatísticas sobre greves
Em 2009, os sindicatos apoiaram o governo democrata nas eleições intermediárias da época em troca de leis que os ajudariam - e receberam muito pouco em troca.

Desta vez, os líderes sindicais bateram o tambor novamente em favor de Biden, e só o SEIU deu US$ 150 milhões aos democratas. Reduzir a ação dos militantes e implorar aos democratas não é uma estratégia que pode ganhar muito e, na verdade, não foi pensada para isso; é uma estratégia para reduzir um pouco o índice de perdas. Biden e os democratas estarão sob constante e extrema pressão - quando o estímulo não conseguir salvar a economia - para fazer a classe trabalhadora pagar por meio da austeridade. Nós, trabalhadores, seremos bucha de canhão dos capitalistas se não começarmos a nos organizar agora.

Para derrotar os planos capitalistas, bem como o poder da extrema direita, precisaremos de sindicatos militantes que adotem táticas militantes como as greves. Isso significa nos organizar em nossos sindicatos a partir de baixo, em conselhos de trabalhadores e organizações de base que obrigam os burocratas a promoverem medidas de luta. Ao mesmo tempo, é necessário apoiar e promover greves selvagens em setores que não têm sindicato ou que se rebelam contra os burocratas. Isso significa reconhecer que é a nossa ação organizada que atinge os objetivos - greves, protestos, paralisações, piquetes, etc. - e não implorar reformas ao Partido Democrata.

Mas não podemos lutar de verdade contra a austeridade dos democratas e da extrema direita quando estamos isolados em nossos sindicatos separados. Precisamos, acima de tudo, que nossas organizações lutem, desde a base, para impor aos dirigentes sindicais uma frente única para a luta. Isso significa exigir que os líderes que apoiaram eleitoralmente os democratas lutem pelas demandas que os trabalhadores decidem. Ações conjuntas devem ser construídas entre os sindicatos e entre as organizações da classe trabalhadora, como as seções locais do BLM, os desempregados e o movimento estudantil. Muitos trabalhadores que votaram em Biden terão uma experiência com o novo governo e essa experiência só pode ser acelerada com base na experiência na luta de classes. Somente o poder combinado da classe trabalhadora será capaz de repelir os ataques que já começaram. E quanto mais militante for essa luta de classes, melhor nos protegeremos da classe dominante que está em pânico de que a crise irá impedir a acumulação massiva de lucros.

Isso significa não apenas impor esse tipo de unidade militante à burocracia sindical, mas também encontrar maneiras criativas de chegar a setores mais amplos da classe trabalhadora, especialmente os negros e os oprimidos dentro das comunidades e o vasto exército de desempregados e subempregados. Nas comunidades, implica também lutar contra o controle burocrático das ONGs pró-democratas que controlam os movimentos sociais anti-democraticamente, como vimos com o BLM. Na experiência da luta comum dos trabalhadores e do movimento negro ou dos jovens que lutam contra as mudanças climáticas ou a onerosa dívida estudantil, os setores mais combativos da classe trabalhadora vão ganhando autoridade e se mostrando os mais consequentes. Assim surgirão direções capazes de disputar contra as burocracias sua influência sobre a classe trabalhadora e os movimentos sociais.

É necessário e urgente resgatar as lições do movimento operário dos anos 1930. Quando a Grande Depressão empurrou a classe trabalhadora para o abismo, essa começou a constituir conselhos multirraciais de desempregados promovidos pela Liga de Unidade Sindical (TUUL) - organização criada pelo Partido Comunista (PC) estadunidense, apesar de sua orientação direitista de capitulação ao governo Roosevelt. Este exemplo se espalhou para outros grupos, e surgiram organizações e conselhos em Chicago, Seattle, Ohio, West Virginia e Pensilvânia também promovidas por trotskistas. A seguinte anedota de Christine Ellis resume a força e o potencial dessas organizações de frente única:

Falamos com sinceridade, explicamos a plataforma, as reivindicações e as atividades do conselho de desempregados. E aí a gente disse: “Alguma pergunta?” ... Finalmente, um velho negro se levantou e disse: “O que você vai fazer com aquela família negra que eles expulsaram hoje de casa? ... Eles ainda estão aí fora com seus móveis na calçada”. O homem que estava comigo disse: “Muito simples. A gente vai acabar a reunião e vai lá colocar a mobília de volta na casa. Aí depois, quem quiser entrar para o conselho dos desempregados e criar uma organização de combate aos despejos, volte a esta sala e conversaremos um pouco mais sobre isso” Fizemos isso ... todos os outros colaboraram, começaram a recolher até o último móvel, a consertar as camas ... e quando estava tudo pronto, voltaram para a sala. A sala estava lotada.

Por uma plataforma comum que unifique a classe trabalhadora com o movimento antirracista

Além da criação dessas organizações e novas instituições da classe trabalhadora e dos oprimidos, a construção de uma frente única dos trabalhadores contra o novo governo significa organizar concretamente os sindicatos e a comunidade, as organizações sociais e políticas que representam os interesses da classe trabalhadora, em torno de um plano nacional de luta e um conjunto unificado de demandas. Acreditamos que uma plataforma nacional de luta deveria incluir em seu programa:

* Expandir e aumentar os benefícios de desemprego para todos os trabalhadores desempregados ou subempregados, incluindo imigrantes sem documentos, estudantes e aqueles que já estavam sem trabalho antes da crise atual.

* Cancelar imediatamente a dívida médica e estudantil, tanto pública quanto privada.

* Proibir todas as demissões durante a crise para evitar que o desemprego aumente e proteger o sustento dos trabalhadores.

* Redistribuir as horas de trabalho a todos os trabalhadores disponíveis sem redução salarial - esta é a melhor solução para a crescente crise de desemprego e reduzirá a exposição dos trabalhadores à Covid-19.

* Garantir renda proporcionada pelo Estado a todas as pessoas que não possam trabalhar por questões de saúde ou de cuidado de crianças. Exigimos a aprovação imediata do auxílio de US$ 2.000 para todos, incluindo trabalhadores sem documentos.

* Fornecer moradia para todos, confiscando milhões de apartamentos e casas vazias de proprietários que querem obter lucro. Cancelamento dos aluguéis de imobiliárias e grandes proprietários durante o período de crise, junto com o pagamento de aluguéis atrasados, que datam do início do fechamento.

* Fim dos despejos. A Covid-19 não pode aumentar o número de desabrigados. Nenhuma pessoa ou família deve ser expulsa de sua casa.

* Organizar os trabalhadores precários e desempregados. Apenas um em cada dez trabalhadores americanos é sindicalizado hoje. Isso deve mudar. Como sugere uma pesquisa da Gallup, 65% dos americanos são a favor da sindicalização.

* Abaixo todas as leis anti-sindicais que ameaçam a organização dos trabalhadores independentemente do estado. Abaixo os limites ao direito de organização ou de greve. Todo trabalhador deve ter pleno direito a um sindicato para se defender, lutar e fazer greve.

* Estabelecer uma democracia sindical plena, que inclua a eleição direta de todos os funcionários e dirigentes para que recebam o salário do trabalhador médio, sem privilégios ou benefícios especiais. Expulsar a burocracia sindical que entrega nossas conquistas aos patrões e ao Estado em troca de se enriquecer.

* Aprovação imediata do Medicare For All no caminho para nacionalizar o sistema de saúde sob o controle dos trabalhadores, com assistência médica universal gratuita para todos os que vivem nos Estados Unidos, independentemente de idade, renda, emprego ou status de cidadania.

* Prender os policiais assassinos que, com a bênção do Estado, matam e perseguem negros, latinos e o resto da classe trabalhadora impunemente.

* Expulsar todas as organizações policiais de todos os sindicatos, imediatamente, e dissolver todos os "sindicatos" policiais que permitem o assédio policial, falsas prisões, espancamentos e assassinatos.

* Fornecer acesso seguro e irrestrito aos cuidados de saúde reprodutiva, incluindo o aborto. O direito de escolha não deve depender da decisão da Suprema Corte, da lei estadual ou da capacidade de pagar por procedimentos médicos caros, especialmente em meio a uma crise econômica.

* Ampliar e garantir o acesso à saúde para todas as pessoas trans. A pandemia colocou as pessoas trans em um risco desproporcional. Mas a discriminação e a falta de acesso os impediram de receber cuidados de saúde por muito mais tempo. As pessoas trans devem ter acesso irrestrito a todas as formas de cuidados de saúde, sem medo de discriminação ou perseguição.

* Fornecer a vacina contra a Covid-19 de forma gratuita e generalizada para todos, sob o controle dos trabalhadores, comunidades, profissionais de saúde e cientistas.

* Organizar assembleias de base nas comunidades e locais de trabalho para discutir uma plataforma comum de luta como a anterior e garantir a autodefesa e a segurança das comunidades e dos trabalhadores contra os ataques da extrema direita e da polícia.

* Legalização imediata dos 11 milhões de trabalhadores sem documentos nos Estados Unidos. Fim da repressão aos migrantes e desmilitarização da fronteira sul para garantir a abertura das fronteiras.

* Acabar com os ataques imperialistas do governo Biden contra nossos irmãos e irmãs dos povos oprimidos do mundo e acabar com as sanções e o bloqueio econômico contra a Venezuela, Cuba e o Irã.

A classe trabalhadora enfrenta grandes ameaças nos próximos anos, mas também grandes possibilidades. Temos em nossas mãos o poder de lutar contra a extrema direita e conquistar todas as nossas demandas. Nesta luta comum dos trabalhadores e dos oprimidos, a experiência das massas trabalhadoras que votaram em Biden e nos democratas se desenvolverá e a própria dinâmica da luta revelará o verdadeiro caráter do Partido Democrata e do regime bipartidário. Ou seja, na luta de classes, a robusta e multiétnica classe trabalhadora americana aprenderá a distinguir quem são seus amigos e quem são seus inimigos.

Tradução para o português: Caio Reis


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FOOTNOTES

[1Em referência aos membros da Câmara de representantes que conformam a ala “progressista” do Partido Democrata, cuja figura mais conhecida é Alessandra Ocassio-Cortez
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