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DEBATE | Existe limite para a adaptação oportunista da CST no PSOL?

Em um país marcado por anos de situação reacionária e agora pelo governo de Frente Ampla Lula-Alckmin, que busca canalizar as insatisfações pela via das instituições, o PSOL se integrou ao governo de conciliação de classes. Queremos debater com a CST, que define por vezes as políticas do PSOL como "traição", "erro grave", que o PSOL “não tem independência política”. Mas qual é o valor para a CST das suas próprias palavras se continua construindo esse partido?

sexta-feira 10 de março de 2023 | Edição do dia

O debate sobre os desafios da esquerda que se reivindica socialista e revolucionária é fundamental na situação nacional, e queremos seguir nossos debates com a Corrente Socialista de Trabalhadores (CST), corrente interna do PSOL, que faz parte da corrente internacional UIT-QI.

Fizemos uma série de discussões com o companheiro Diego Vitello no Esquerda em Debate, assim como sobre a tradição de Nahuel Moreno (reivindicada pela CST, PSTU, MES e outras correntes do PSOL) que desorienta a localização dessas correntes, como por exemplo frente à guerra da Ucrânia, que coloca todos estes grupos se adaptando ao bando da OTAN, e outros debates de tática e estratégia.

Consideramos positivo que, apesar das diferenças, tenhamos participado ambas correntes do Polo Socialista Revolucionário, e inclusive soltado uma nota em comum contra a política do PSTU de encerrar essa iniciativa. Assim como nossa atuação em comum na Frente de Esquerda e dos Trabalhadores - Unidade (FIT-U), na Argentina, e nas eleições no Chile. São experiências que nos fazem seguir debatendo por um polo de independência de classe no Brasil.

Faremos aqui o debate sobre o PSOL novamente, numa continuidade do artigo mais recente que publicamos na Argentina, em discussão com a organização irmã da CST, a Izquierda Socialista, sobre a política no Brasil, onde resgatamos o debate histórico dos socialistas sobre o “ministerialismo”, e o compromisso político que significa para o conjunto do PSOL e para a CST, estar num partido que integra o governo, sendo agora o PSOL inclusive vice-líder do governo na Câmara. E como continuidade do artigo onde desenvolvemos um balanço da atuação da CST no PSOL historicamente, que definimos como “oposição interna inofensiva”, em contraste com a atuação da Corrente Comunista Revolucionária na França que por sua atuação principista construíram uma força orgânica real confluindo com setores da nova vanguarda operária da luta de classes francesa, e por enfrentar a política de diluição da ex-maioria mandelista da direção do NPA foram excluídos burocraticamente do partido com uma força que representava cerca de 30% do NPA, o que deu lugar à fundação da nova organização revolucionária na França chamada Revolução Permanente, que integra a FT.

Mencionamos estes debates para evitar repetir neste artigo tais argumentos, que mantêm sua completa vigência e seguem sem resposta. Caberia à CST responder de alguma maneira, se quer preservar os fundamentos revolucionários de sua organização. Mas vamos aos novos argumentos.

“Erro grave” é separar a tática em relação à estratégia

A CST tem o orgulho de ser uma corrente fundadora do PSOL, e já se vão 20 anos neste partido. Não é estranho para quem rompeu com o PT somente em 2003, quando este virou governo federal e atacou com a reforma da previdência. Justificam essas estadias como uma “questão tática”, mesmo quando estes partidos claramente já perderam a maioria dos elementos progressistas e deixam de cumprir um papel ambíguo junto ao movimento de massas, que são as situações que permitem a atuação dos revolucionários. Era correto participar do PT no seu processo de fundação e dos primeiros anos, quando este tinha muitos elementos classistas e uma ampla participação operária fruto do profundo ascenso que estava em curso no país. O PSOL em seus primeiros anos expressava um processo de ruptura com o PT pela esquerda, e é possível debater determinados momentos onde este cumpria um papel progressista e que fundamentava uma tática eventual em relação a ele. Mas isso é bem diferente de uma atuação permanente junto a partidos que deram saltos de qualidade em sua integração ao regime político, como faz a CST ao longo de sua história. É impossível construir uma corrente revolucionária com força material se ela não aparece com uma posição independente de organizações que deixaram de cumprir um papel essencialmente progressista.

Quando esse tipo de política oportunista se justifica como uma “questão tática”, coberta de definições (em jornais que poucos lêem) dos “erros graves” e “traições” do PSOL, trata-se de uma flagrante separação entre tática e estratégia, que não tem nada a ver com a tradição marxista revolucionária.

Na tradição revolucionária marxista, sempre se combinou um variado “arsenal” de táticas para a construção do partido revolucionário, partindo de que este não vai se construir evolutivamente, mas em processos vivos de rupturas e fusões. Mas elas foram principistas sempre quando não se separaram da estratégia. Abordaremos duas que ajudam a pensar a questão do PT e do PSOL. A participação no PT das origens não somente era correta, mas inclusive tem correspondências diretas com a tática de PT formulada por Trotsky nos anos 30 nos EUA. Ou participar como corrente dentro de organizações que não são revolucionárias, também foi uma das táticas utilizadas, mas sempre sob determinados critérios (tempo, papel que tal organização cumpria na realidade, se tinha uma dinâmica à esquerda, etc).

Mas não se trata disso o que faz a CST. O que faz, na verdade, é transformar a tática em estratégia, na construção de partido. Com isso, fortalecem os reformistas no PSOL, e cumpre um papel de dar uma aparência mais de esquerda para o PSOL do que este partido é de fato, porque se colocam como revolucionários e pela independência de classe mas constroem este partido, se negando a construir uma alternativa independente. E inclusive terminam se debilitando como corrente política. Para os revolucionários, o caráter do espaço onde se intervém determina até onde vai a flexibilidade tática. A CST seguir construindo o PSOL, ainda que digam que é “criticamente”, não muda em nada o caráter deste partido, mas avaliza o mesmo caráter, mesmo que faça uma propaganda distinta para poucos de sua periferia.

Mas para além deste debate de fundamentos, o que agrava toda a situação é que mesmo esse “criticamente” no caso da CST é limitado, como já debatemos, em contraposição com a atuação claramente delimitada da nossa corrente na França num “partido amplo”, sendo que o NPA nunca chegou ao nível do PSOL de administrar o Estado capitalista. Por isso a CST sequer incomoda a direção majoritária do PSOL, adotando inclusive táticas como sair de cargos de direção ou não votar nas candidaturas executivas que foram abertamente de conciliação de classes, mas sem deixar de construir o partido. Mas vejamos o problema de conteúdo por trás dessa adaptação aos reformistas e à ala majoritária do PSOL.

A política oportunista de PSOL das origens e da “Frente de Esquerda Socialista”

O debate com a CST vai muito além de qual seria o momento correto de ruptura (que para a CST parece que nunca vai chegar) ou um debate sobre quais são os limites possíveis para uma atuação dentro de um “partido amplo”.

A CST segue neste momento defendendo voltar a um PSOL das origens. Não estamos falando mais do PT das origens, que era um partido classista, com dezenas de milhares de trabalhadores e peso de massas, mas um “partido amplo” que dentro dos seus fundamentos de origem, defendia unir reformistas e revolucionários, o que a CST segue colocando como objetivo a seguir, mesmo depois do desbarranque do PSOL.

Nossa corrente na França nunca concordou com os "princípios fundadores do NPA”, o que foi um fator decisivo em toda nossa construção como corrente independente. Mesmo nos anos em que atuamos no NPA, nossa política sempre foi refundar o NPA sob novas bases revolucionárias, na luta por um partido revolucionário, em choque com a maioria do partido, o que foi parte de dar base para construir uma corrente revolucionária internamente no partido.

A mesma lógica oportunista da CST está por trás da proposta que sempre defendeu de “Frente de Esquerda Socialista”, que seria com os que construímos o Polo Socialista Revolucionário, mas também o PSOL, a UP e PCB. Onde estão agora estes “socialistas” com quem a CST propunha uma “tática principista” como essa, também de forma tão permanente que virou praticamente uma estratégia? Enquanto o PSOL assumiu um ministério, a UP também virou base de sustentação do governo e está cada vez mais irmanada com a burocracia sindical, e o PCB se coloca como “independente”, mas também não vai além de propor “mobilização para pressionar o governo”.

É por esta concepção oportunista em relação aos “partidos amplos” e a defesa de unidades políticas em partido e “frentes” com organizações de conciliação de classes, que a UIT também no Peru perdeu oportunidade de construir uma corrente independente, assim como no Estado Espanhol participando das CUP.

Até onde vai a tolerância da CST?

Faz anos que a CST debate qual seria o momento de romper com o PSOL, mas este nunca chega, assim como não expressam qual é o balanço que fazem desses 20 anos dentro desse partido, mesmo depois da experiência de mais de 20 anos no PT. Não romperão nem agora quando o PSOL já faz parte da administração do Estado capitalista? Prefere seguir debatendo falsas “táticas independentes” num partido completamente adaptado ao regime, como foi a defesa da CST da folclórica “candidatura independente” do PSOL para presidência na Câmara dos Deputados?

A CST está tão apegada ao PSOL que perdeu inclusive a oportunidade de romper junto com uma série de militantes como Plinio de Arruda Sampaio Jr, Marinalva Oliveira, Dirlene Marques. Assim, contribuiu para a dispersão e não para aglutinação dos que querem construir uma alternativa independente. Para além disso, a política de seguir no PSOL é o oposto da política que a CST leva na Argentina, onde integra a FIT-U, que mantém a independência de classe enquanto amplia sua influência. Os militantes da CST não consideram completamente contraditório essa disparidade de política de sua corrente entre ambos países? Essa é sua concepção de internacionalismo?

Seguimos insistindo no chamado aos companheiros e companheiras da CST a romper com o PSOL, abrirmos os debates de tática e estratégia necessários para construirmos um polo de independência de classe no Brasil que de fato tenha correspondência e coerência com o exemplo da FIT da Argentina.




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