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CRÔNICA | “Meu filho foi espancado por ser LGBT”, relato de uma mãe às professoras de uma escola

A violência contra a comunidade LGBTQI+ se aprofunda em meio ao governo negacionista e ultra reacionário de Bolsonaro, Mourão e militares. O regime político do golpe institucional impõem às LGBTs uma vida de miséria. Abaixo uma crônica a partir de um fato real que ocorreu em uma escola da rede estadual de São Paulo, no município de Campinas.

terça-feira 6 de julho de 2021 | Edição do dia

Por motivos de segurança, os nomes das personagens dessa crônica não correspondem aos nomes reais.

O retorno inseguro das aulas presenciais impuseram a comunidade escolar não somente o medo da contaminação diante do negacionismo de Bolsonaro e da demagogia de governadores e prefeitos, mas trouxe também para as rodas de conversas e corredores das escolas o desespero vivido pelos trabalhadores da educação, pelos estudantes e seus familiares diante da miséria instalada no país.

Era uma tarde qualquer e eu, uma jovem professora, comecei a escutar um choro. Era Rosa, avó de várias estudantes da nossa escola. Rosa chorava porque seu estômago, e o de suas crianças, ardia de fome. Sim, o governador João Doria que se diz preocupado com a educação e futuro das crianças e jovens do Estado de São Paulo não criou nenhuma política de segurança alimentar em meio à pandemia! Me aproximei de Rosa e ela chorava de emoção após Aparecida lhe entregar duas cestas básicas. Há mais de um ano de pandemia declarada foi a comunidade escolar, por meio de campanhas de doações, quem conseguiu ajudar a ter comida no prato de centenas de milhares de estudantes.

Infelizmente, o desespero de Rosa não é uma situação excepcional. Todos os dias é uma enxurrada de informações e situações como essa que revelam o caos que está a vida da classe trabalhadora e da juventude diante do desemprego recorde, da inflação que corrói o nosso salário (quando temos!) e de um governo que não somente descarrega a crise capitalista nas nossas costas, mas que ri – com sorriso largo – do nosso luto e desespero.

E, a Rosa voltou. Passado um mês, talvez nem nisso, a Rosa voltou. Quando escutei sua voz logo fui em sua direção. Mudou a estação, chegou o inverno, e ela falava sobre o frio. Não tinham cobertores ou eram insuficientes. Aparecida, professora, logo arrumou um punhado de cobertores para ela e mais alimentos. Rosa, novamente, se emociona. Foi inevitável não se emocionar com ela e todos os desafios que nos contava. Perguntei como estavam as crianças. A resposta: tá difícil, falta tudo, dormimos quatro em um colchão! Dias após em sua casa, junto com Marisa, outra professora da escola, fomos levar mais alimentos e roupas. Os olhos registraram retratos sofridos em meio aos sorrisos das crianças que arrancavam alegria das pequenas coisas.

Rosa se emociona ao falar do filho que não morava mais com ela. Ela queria desabafar. Falou sobre saudades e de como foi bom encontrá-lo nos dias anteriores. Ela já havia mencionado, em outra conversa, sobre seu filho Carlos, mas não desenvolveu o que ocorrera. Dessa vez perguntei porque Carlos não podia morar com elas. Carlos é gay. Isso deveria ser uma informação como outra qualquer, mas não... Carlos é gay em uma sociedade que espanca, assassina e humilha as LGBTs.

O filho de Rosa, que é um grande parceiro de vida, foi espancado na comunidade, pois não aceitaram a sua orientação sexual. Rosa chorava com dor, aquilo me rasgava o peito. Ela contava como ele era um menino bom, trabalhava recolhendo recicláveis, ajudava no cuidado das crianças e da casa. Era uma mistura de sorriso e lágrimas. Dizia que aceitava o filho como ele era, mas a comunidade não. Tiveram que sair às pressas e quando retornaram... Bom, no retorno não cabia mais a possibilidade de Carlos estar junto. O recado foi dado e a vida seguiu por caminhos distintos que ora se cruzam. Eu e Marisa em silêncio, escutamos aquela história enquanto engolíamos uma saliva que parecia carregada de pedras.

Sou professora, sou LGBT, convicta cada dia mais da necessidade latente de combater toda forma de opressão. Se a sociedade capitalista nos relega uma vida de miséria onde se combina da maneira mais perversa possível exploração e opressão... Registro aqui nessa crônica despretensiosa... que também dedico junto a outros camaradas, colegas de trabalho e jovens a minha vida inteira por uma sociedade onde possamos expressar livremente a nossa identidade de gênero e a sexualidade. Uma batalha incansável por uma vida plena de sentido!

POR CARLOS, LUCAS, GABRIEL, KELLY, ROBERTA… BASTA DE LGBTfobia!

Não vão nos calar. Vai ter discussão de gênero e sexualidade nas escolas!




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