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O papel da polícia em "O Desespero de Odete" de Yago OPróprio

Gabriel Brisi

O papel da polícia em "O Desespero de Odete" de Yago OPróprio

Gabriel Brisi

A vida imita a arte alguns diriam. Nessa música, lançada alguns meses antes de uma das maiores chacinas do Rio de Janeiro, a chacina do Jacarezinho, Yago Oproprio e Murica nos apresentam "o desespero de Odete", mas que poderia ser o desespero de pelo menos 25 mães que perderam seus filhos neste dia 6 de maio ou ainda mais 823 mães que tiveram seus filhos assassinados pela polícia entre junho de 2020 e março deste ano.

As duas da tarde, a polícia que mais mata no mundo subiu o morro. Entre os mortos da operação, estavam os filhos de Odete, que agora aos prantos clama por socorro. As lágrimas se misturam com o sangue no rosto dessa mãe, que no aguardo de uma resposta divina, vê descer mais uma vez a polícia. Naquela madrugada "os home" que invadiram, sentaram o pipoco, num foi pouco, como diz o verso da música.

Eu ouvi Odete pedindo socorro
Duas da tarde no morro Brejão Santa Luz
E os home que invadiro sentaram o pipoco
E ela com os filhos nos braços fez sinal da cruz

A vida imita a arte alguns diriam. Nessa música, lançada alguns meses antes de uma das maiores chacinas do Rio de Janeiro, a chacina do Jacarezinho, Yago Oproprio e Murica nos apresentam "o desespero de Odete", mas que poderia ser o desespero de pelo menos 25 mães que perderam seus filhos neste dia 6 de maio ou ainda mais 823 mães que tiveram seus filhos assassinados pela polícia entre junho de 2020 e março deste ano.

Apelou pra Xangô, Balaô, Yemanja
Nada disso vai adiantar
Leva consigo
O desespero da certeza de saber
De que não vai ver o filho crescer

Leia mais em: Chacina do Jacarezinho é mais uma ferida aberta do golpe institucional

Num ritmo de samba-rap, somos apresentado a histórias de lágrimas e sangue já bem conhecidas pela maioria pobre e negra das favelas e periferias brasileiras. Histórias que quase se complementam e nos deixam intrigados em saber o que dessas canções é ficção e o que é realidade, mas como o eu lírico traz na letra "Sob o Sol, nada novo", pois sabe que a realidade ali retratada não é novidade para nenhum dos ouvintes.

Sob o sol nada novo e o povo
Segunda-feira já esqueceu
Quem que matou, quantos morreu
E os frutos que ano de 64 deu

O papel da polícia na sociedade capitalista é proteger a propriedade privada, os capitalistas e sua ordem, através do uso da violência contra os trabalhadores, a juventude, e o povo, sobretudo os pobres e negros. Sua função social, portanto, é a manutenção violenta da ordem elaborada em prol dos ricos, contra os trabalhadores e os pobres, sendo o braço repressor do Estado burguês. "Pacificando a quebrada inteira" diz a música em tom de ironia, aos sons de tiro, pois sabe que a falácia da pacificação é para encobrir as ações classistas e racistas da polícia, que quando sobe o morro não é para pacificar, mas sim matar os jovens negros e periféricos.

Pa-pa-cificando a quebrada inteira
Chega sexta-feira
Dia de crachá
Pa-pa-cificando o filho leva um tiro
Foi correr perigo
Indo trabalhar

Leia mais em: Precisamos conversar sobre a polícia

Como sabemos, essas invasões são frequentes e a música traz esse sentido de rotineiro. O assassinato que acontece em uma sexta-feira, na segunda-feira, quando a rotina volta Odete e as outras testemunhas precisarem ir trabalhar de novo, tudo precisara ser esquecido, afinal nem direito ao luto essas mães tem. Muitas vezes, essas mortes serão apenas mais alguns nomes nos jornais burgueses, porem com garantia de impunidade aos assassinos que seguem a vida no aguardo de mais uma ação a mando do Estado capitalista, para subirem em mais uma favela e aumentarem o número de mortos.

“Quem já matou? Quantos morreu?” Esse verso que traz questionamentos tão importantes não poderia ficar de fora. Quem mata é a polícia, seja militar ou a civil, como na chacina de Jacarezinho. Essas instituições cumprem seu papel no capitalismo mantendo a nossa classe com medo ou assassinada. Quantos morreram, é um questionamento difícil de responder, afinal as estatísticas são da própria polícia, que podem ocultar números reais, mas podemos ficar com alguns números, como os 823 mortos em 10 meses ou o fato de que 86% dos mortos pela polícia são negros. A polícia é racista e agora os filhos de Odete são mais um para estatística.
Mas nós não esquecemos os assassinados, nem as operações que nos matam todos os dias.

Não, com nóis não, sangue bom
Se esqueceu que nois é malan’
E o que vira é a revolução

As forças de segurança não podem ser reformadas para ficar do lado da classe trabalhadora e oprimida, por isso a luta contra as brutais chacinas é a luta pelo fim da polícia. Mas, para que haja a abolição da polícia, devemos lutar contra o Estado burguês e o capitalismo de conjunto.


Leia mais em:
A luta para acabar com a polícia é a luta para acabar com o capitalismo


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Gabriel Brisi

Estudante de Ciências Sociais - Unicamp
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