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OPINIÃO | O “trem fest” carioca: transportes públicos, bailes funk, e a hipocrisia assassina do “combate à pandemia” dos capitalistas e seus governos

Na última sexta feira, 19, o trem do ramal Japeri, da Supervia carioca estava lotado. Até aí, tudo normal, a classe trabalhadora está mais que acostumada com o fato de que para quem trabalha, isolamento social não passa de um mito. Mas essa semana havia algo de diferente: um baile funk, intitulado “Trem fest” tomou os vagões do transporte público. O escândalo hipócrita dos empresários, políticos e da grande mídia frente ao evento, em um contexto onde milhões de trabalhadores são rotineiramente enfurnados em transportes precários enquanto MCs são presos com a desculpa de “prevenir aglomerações” é ilustrativo do que é o “combate à pandemia” pelas mãos da burguesia.

domingo 21 de março de 2021 | Edição do dia

O transporte público é um antigo algoz da classe trabalhadora carioca. A supervia, em particular, é conhecida dos trabalhadores da cidade por seu serviço ruim, trens velhos, linhas e circulação insuficientes, e passagens cada vez mais caras para um serviço que só piora. A pandemia não fez mais do que escancarar essa realidade. Desde o início desta crise sanitária, que já tirou a vida de quase 300.000 brasileiros, a empresa de trens urbanos, hoje controlada pela japonesa da Guarana Urban Mobility Incorporated, cortou o número de linhas e trens em circulação enquanto escalava o preço das passagens, isso para uma frota na qual grande parte dos trens trem mais de trinta anos!

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É nesse transporte que a classe trabalhadora é obrigada a se enclausurar por longas horas em sua rotina diária. A Supervia é a mais refinada ilustração do que é a hipocrisia do suposto “combate à pandemia” dos governos capitalistas. Enquanto governadores que até ontem eram aliados de Bolsonaro tentam se descolar da imagem do negacionista anunciando supostas medidas frente à pandemia, a classe trabalhadora segue tento para si o direito ao isolamento social negado. Todos, a serviço dos empresários, se recusam categoricamente a fechar setores não essenciais da economia. Enquanto anunciam medidas totalmente torpes e parciais, como um fechamento de bares e restaurantes que só vale a noite (ou seja, nada faz para prevenir o contágio) negam aos trabalhadores qualquer meio de sustento além de arriscarem a vida indo trabalhar (para nem falar do auxílio emergencial, que agora retorna em um valor menor do que de uma cesta básica), e insistem em manter as escolas abertas mesmo com professores morrendo!.

Nesse contexto de absoluta insanidade capitalista, a hipocrisia dos golpistas e dos empresários em nome dos quais governam fica ainda mais nítida. Enquanto tudo segue aberto pela maior parte do dia (a notória declaração do dono do Madero sobre a importância de manter tudo aberto “mesmo que custe vidas” parece ter superado o choque inicial que alguns setores empresariais fingiram ter e se convertido plenamente em mantra geral), e trabalhadores são forçados não só a saírem para trabalhar em locais insalubres e expostos ao contágio, mesmo em atividades não essências, mas também a chegarem lá em transportes públicos lotados, caros, e de péssima qualidade, onde o contágio é certo, a polícia fortalece a repressão contra bailes funk, com a desculpa de “evitar aglomerações”! MCs famosos do Rio e do país afora têm enfrentado perseguição judicial por promover os eventos.

Eis que surge o “Trem Fest”. Organizado pelas redes sociais, a ideia do evento é bastante simples: um baile funk, só que dentro de um trem. As imagens e vídeos do evento chocaram. De todos os lados, dispara-se indignação frente ao “muito desrespeito às restrições impostas por causa a pandemia”, nas palavras do G1. Até a Supervia teve a pachorra de dizer que “repudia o comportamento registrado nos vídeos”. Só pode ser piada. Basta entrar em um trem da Supervia para saber que tudo o que agora “repudiam” – a aglomeração, o não uso de máscaras etc. – só difere do funcionamento normal dos trens pelo fato de quem está lá, desta vez, ter ido voluntariamente. Conscientemente ou não, o “trem fest” acaba por denunciar perfeitamente a hipocrisia daqueles que, a título de “combater a pandemia” só fazem fortalecer as forças policiais contra a juventude negra, ao passo que dão salvo conduto para empresas de transporte seguirem entulhando trabalhadores em locais de alto risco de contágio, mantém escolas abertas, e recusam-se terminantemente a sequer ameaçar tocar nos lucros dos grandes empresários, nem que seja para diminuir a circulação do vírus.

Um verdadeiro combate à pandemia não tem nada a vez com o falso choque hipócrita dos empresários que vociferam “contra aglomerações” enquanto insistem em manter a economia aberta e os trabalhadores forçados a arriscarem a vida para pagar as contas do mês. O combate à pandemia envolve um plano de emergência contra a crise sanitária, que só pode ser imposto pelos trabalhadores! Prevenir o contágio requer renda digna para que todos possam ficar em casa! Envolve a liberação de trabalhadores de todos os setores não essências e dos grupos de risco de toda a economia! Esse programa nunca virá dos que governam em nome dos empresários! Para eles, o lucro é o essencial, e o “combate à pandemia” se resume a um moralismo hipócrita contra o (escasso) divertimento das classes populares. Se quisermos, verdadeiramente, que a vida esteja acima do lucro, o essencial é a luta da classe trabalhadora pelo direito à renda digna e à quarentena, contra todo esse sistema golpista e os empresários assassinos e hipócritas que os sustentam!

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