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UFRGS | Por um Diretório Acadêmico de Psicologia/UFRGS que seja parte de reerguer o movimento estudantil

Em meio à pandemia, o governo de Bolsonaro e Mourão junto a todos os atores do regime político, como STF e Congresso Nacional, descarregam ainda mais a crise capitalista nas nossas costas. Uma crise que vem desde 2008 mostrando que esse sistema reserva para a juventude um futuro de miséria, sem educação e com trabalhos cada vez mais precários. Parte de se armar para enfrentar essa crise imposta para nós, estudantes e trabalhadores, submetidos a uma universidade sob os ataques do interventor bolsonarista Carlos Bulhões, passa por nos organizarmos e tomar em nossas mãos o espaço político das entidades estudantis.

Gabriela MuellerEstudante de História da UFRGS

quinta-feira 18 de novembro de 2021 | Edição do dia

O diretório acadêmico de psicologia da UFRGS, DASEIN ou DAP, assim como inúmeros centros e diretórios acadêmicos, enfrenta uma preocupante paralisia durante a pandemia, sem ser um espaço de mobilização estudantil e debate sobre a situação de ataques que vivemos desse sistema cada vez mais degradado, que nos impõe a precariedade. Esse esvaziamento do espaço , no entanto, não começou com a pandemia.Com esse texto, queremos abrir uma reflexão sobre como tirar nosso diretório acadêmico dessa paralisia e potencializá-lo como uma verdadeira ferramenta de luta e organização dos estudantes da psicologia na UFRGS.

Resgatar o histórico de luta do Diretório Acadêmico da Psicologia UFRGS

Os diretórios e centros acadêmicos são espaços de representação dos estudantes em cada curso e departamento da universidade, e podem ser importantes ferramentas de luta e organização do movimento estudantil. Isso, no entanto, não é automático, porque, para tal, esses espaços devem contar com uma vanguarda ativa que se preocupe em ouvir os anseios de seu curso e elevá-los politicamente, conectando-os aos desafios políticos que enfrentamos, batalhando para que cada estudante seja sujeito desse processo. Para que os estudantes enxerguem esses espaços como suas ferramentas e exista mobilização no curso, o diretório acadêmico precisa ser democrático e ativo, chamando reuniões abertas, assembleias e espaços onde as diferentes posições políticas possam se expressar e serem levadas adiante pela decisão da maioria. Ou seja, a orientação política e a forma de gestão são decisivas para que esses espaços cumpram um papel assim.

O Diretório Acadêmico de Psicologia já foi exemplo de organização estudantil. Conforme o relato de uma ex-estudante da década de 80, hoje professora no curso, a chapa eleita que dirigia o DAP em 1979, em meio à ditadura, organizou os estudantes para atuar junto aos trabalhadores contra os ataques do regime da época. Naqueles tempos, operários da construção civil e bancários de Porto Alegre, na esteira do movimento grevista dos metalúrgicos do ABC paulista, entraram em greve e a gestão do DAP mobilizou o curso para irem às ruas recolher fundo de greve para os trabalhadores, cercando os grevistas de solidariedade em um importante exemplo de aliança operário-estudantil.

Outro exemplo de mobilização, relatado por essa mesma ex-estudante, foi a greve dos estudantes de psicologia, na década de 80, por mudanças curriculares na grade do curso, cuja estrutura curricular tinha fortes resquícios de uma educação da ditadura, que contava inclusive com alguns professores colocados pelo regime militar. Essa greve, impulsionada pela gestão do Diretório Acadêmico de Psicologia, teve uma série de conquistas estruturais para o curso e para os estudantes que perduram até hoje, com a conquista da Clínica da UFRGS, mais concursos para professores e abertura de novos departamentos.

Além disso, o Diretório Acadêmico também era parte de organizar encontros regionais e nacionais de estudantes de psicologia para que os estudantes debatessem e decidissem sobre qual psicologia lhes servia, criticando os vícios de uma psicologia da ditadura que servia aos interesses do regime. Hoje, esses encontros poderiam ser uma ferramenta de ativação dos estudantes para refletirem o papel que a psicologia nos tempos de crise capitalista, aprofundada pela pandemia, poderia cumprir, girando serviços de saúde mental, estágios e clínicas para atender os tantos jovens que tiveram suas subjetividades esmagadas pela crise. Por isso, é imprescindível discutirmos a atual situação do nosso diretório acadêmico para que ele seja de fato capaz de resgatar e potencializar essa história de luta.

A atual forma de gestão do DASEIN

O DAP/DASEIN funciona como autogestão desde 2014, segundo seu estatuto. A autogestão é um tipo de gestão onde não devem haver hierarquias ou representantes. Para ser parte da gestão, bastaria estar matriculado no curso Além disso, conforme esse estatuto, não podem haver eleições para que os estudantes possam discutir e votar nas propostas que mais lhes representam, justamente porque isso resultaria em representantes eleitos. Todas as decisões são tomadas por “consenso” entre aqueles que participam das reuniões. Ou seja, por mais que pareça democrático, pois supostamente todos são parte da gestão, na realidade as decisões são tomadas por um grupo específico que participa das reuniões. Aqui teoria e prática entram em choque, já que a autogestão postula que "não devem haver representantes", o que ocorre é que um grupo de estudantes que não foi eleito por ninguém acaba decidindo sozinho, por fora de debates democráticos com o conjunto dos estudantes e tornando-se, por fim, os representantes do curso. Muitas vezes a massa dos estudantes nem sabe como funciona isso, principalmente aqueles que ingressaram recentemente e em meio ao ensino remoto. No caso da psico/UFRGS, nem têm oportunidade de opinar, pois há muito tempo não são convocados espaços como assembleias e reuniões abertas.

Historicamente, a autogestão é defendida pelo anarquismo e por grupos autonomistas e se liga à concepção do anarquismo de como deve funcionar uma sociedade sem Estado, uma discussão que transcende os limites desse texto. O fato é que, no Brasil, com as Jornadas de Junho de 2013 essas ideias ganharam mais força entre a juventude. Entretanto, foi o próprio PT, junto à UJS/PCdoB, que ajudou a impulsionar gestões assim porque, naquele momento, a juventude se levantava e tomava as ruas justamente contra o governo Dilma, e a autogestão cumpria um papel de garantir que a esquerda, que era oposição ao governo, não pudesse estar nos centros acadêmicos, ao mesmo tempo que nenhum posicionamento crítico ao governo do PT podia se expressar, pois naturalmente, contando com os próprios militantes do PT nas reuniões, não havia consenso sobre isso. Ou seja, muitas autogestões foram funcionais para que as entidades estudantis não organizassem nos cursos a revolta que se expressava nas ruas, porque na medida em que o movimento refluiu, esses espaços foram se esvaziando e sendo abandonados sem que houvesse um setor para batalhar contra esse refluxo. Em tempos de bolsonarismo, essa discussão pode parecer algo distante, mas é importante retomá-la para entender como chegamos até aqui e ver como esse modelo de gestão precisa ser superado frente aos novos desafios que se impõe aos estudantes.

Como parte das concepções anarquistas, uma das definições da autogestão, é que não devem haver partidos ou forças de organizações políticas no diretório ou em qualquer espaço de mobilização. Hoje em dia, “sem partido” é o presidente e sua corja antidemocrática, que defendem isso contra o direito de organização política dos trabalhadores e dos oprimidos. No que diz respeito a uma entidade estudantil, essa definição também é contraditória e equivocada porque, fere o direito de todo estudante se organizar em partido, um direito que reivindicamos assim como o fizeram muitos que lutaram, foram perseguidos, torturados e inclusive morreram na ditadura. Ao mesmo tempo, na medida em que a própria defesa do anarquismo é uma posição política em torno da qual os estudantes se organizam, isso a conforma como “força política”. Quer dizer, por que somente essas posições se expressam no diretório? Por que estudantes que não concordam com isso não podem também se organizar e se expressar politicamente, de maneira democrática e com um debate aberto de ideias?

No caso do DASEIN hoje, infelizmente, não há sequer um grupo ativo. Quando há, o formato da autogestão faz com que os estudantes que tentam ativar o diretório não consigam expressar a vontade da maioria do curso, já que não tiveram oportunidade de debater suas posições com o conjunto dos estudantes em uma eleição. É por isso também que não existem espaços recorrentes democráticos e soberanos de debates e disputa de ideias entre o conjunto dos estudantes. Na pandemia, esse formato não foi capaz de corresponder às necessidades de mobilização dos estudantes, apesar da disposição de mobilização que se mostrou. Frente à necessidade de reerguer o movimento estudantil, fragmentado e esvaziado pelo ensino remoto e por muitos ataques do governo, é preciso que o conjunto dos estudantes possa opinar sobre qual a melhor forma de gestão e qual diretório acadêmico é necessário para organizar o curso.

Outra decorrência da autogestão é a falta de representação do curso em outros espaços da universidade, como no Conselho de Entidades de Base, que é uma reunião de Centros e Diretórios Acadêmicos junto ao DCE, onde a psicologia não teve representantes durante toda a pandemia Mesmo que tivesse, seriam estudantes que, sem nenhum debate com seus colegas, decidiram participar. Quando houve uma campanha contra os desligamentos de 195 cotistas pelo interventor Bulhões, estudantes de psicologia que se organizam na Juventude Faísca, junto a outros colegas independentes, levantaram um abaixo-assinado por matrículas integrais que contou com mais de 3000 assinaturas. O DCE da UFRGS na época chamou um CEB para debater sobre os desligamentos e ninguém da psicologia pôde participar da reunião, apesar dos alunos estarem ativos e impulsionando uma campanha que inclusive saiu na Zero Hora. Esse exemplo mostra a enorme contradição da autogestão, que impossibilitou um dos cursos mais ativos naquela batalha de ter expressão naquele espaço, porque embora estivessem coletando assinaturas por toda a universidade, não tiveram nenhum espaço de debate com o conjunto de seus colegas de curso para decidir democraticamente quem iria no CEB.

É preocupante esse problema num momento em que o movimento estudantil poderia cumprir um papel importante de combate aos ataques deste governo, mas está, por conta da política da União Nacional dos Estudantes (UNE), dirigida por PT, Levante e PCdoB, numa passividade frente ao cenário de crise. Os setores que se coloca à esquerda da direção da UNE, como PSOL, PCB e UP, poderiam ser parte de exigir que a direção da entidade saia da trégua com o governo e organize os estudantes contra Bolsonaro e seus interventores, Mourão e todo esse regime, unificando estudantes e trabalhadores, afinal, a mesma direção da UNE também dirige as maiores centrais sindicais dos trabalhadores no Brasil, CUT e CTB. Esses setores de oposição dirigem hoje o DCE da UFRGS, mas acabam também se adaptando à política da direção majoritária. Isso ocorre porque tanto a UNE quanto a oposição estão mais preocupadas com as eleições de 2022, para as quais Lula cogita alianças inclusive com Alckmin do PSDB, do que com o desafio de reerguer o movimento estudantil frente à crise.

O que fazer?

Há solução para esses problemas, e isso passa por tornar as entidades de base mais democráticas. Isso só pode se dar através do diálogo franco e aberto, para que as diferentes posições políticas possam emergir e ser disputadas pelos estudantes, para que se decida democraticamente qual a melhor forma de gerir um diretório que cumpra o papel de fortalecer o curso para lutar contra o projeto de universidade que o bolsonarismo quer impôr em meio à crise capitalista.

Para nós da Juventude Faísca Revolucionária, um centro acadêmico que cumpra esse papel precisa ser uma ferramenta democrática nas mãos dos estudantes. Isso significa defender o processo eleitoral com voto universal, para que haja uma gestão eleita e legítima na entidade estudantil. Defendemos também que essa gestão deve ser proporcional, quer dizer, todas as chapas que disputarem a eleição serão parte da gestão do centro acadêmico de acordo com a quantidade de votos que tiveram, propiciando dessa maneira que todas as forças políticas existentes no curso possam se expressar no diretório em um debate vivo e frequente com o conjunto dos estudantes

Um exemplo de uma gestão proporcional é o Centro Acadêmico Dionísio, CADi, dos estudantes de Teatro da UFRGS, gerido pela Juventude Faísca e independentes, que alterou seu formato de gestão democraticamente, em assembleia do curso, e hoje dá fortes exemplos de mobilização estudantil e da potente aliança da juventude com os trabalhadores. Em setembro de 2021, quando os rodoviários da Carris de Porto Alegre entraram em greve contra a privatização da empresa, o CADi impulsionou um comitê em apoio à greve da Carris, convocando os estudantes do teatro, CAs e o DCE a se somarem no apoio à luta e na arrecadação de fundo de greve para os grevistas.

Conforme os exemplos dados ao longo do texto, há disposição de luta e organização no curso de psicologia e isso precisa ser potencializado pelo centro acadêmico.

Que os estudantes decidam qual diretório acadêmico querem, pela retomada do DA da psico!

Para isso, na psicologia, é necessário que o curso tome para si o diretório acadêmico, e isso passa por refletir qual forma de gestão é mais democrática e mais permite que o debate de ideias e projetos ocorra. Nesse sentido, é preciso organizar uma assembleia estatuinte, para modificar o estatuto de 2014 que impede eleições e impõe a autogestão. Dessa forma é possível que se abra o debate de ideias entre todos os estudantes, em que todos os setores possam discutir livremente suas propostas, disputando a consciência do conjunto dos estudantes, resultando numa gestão legítima. Nesse processo, nós da Faísca defenderemos uma gestão eleita e proporcional, que represente a maioria dos alunos, dando espaço às distintas posições políticas existentes no curso. A força do movimento estudantil organizado desde cada curso pode ser enorme, com uma juventude aliada aos trabalhadores lutando por uma universidade a serviço da classe trabalhadora e do povo, contra Bulhões, Bolsonaro, Mourão e todo esse regime que só nos reserva a precariedade.

Para isso, é necessário tirar o diretório acadêmico da paralisia, e dar voz ao sujeito político que há em cada estudante. É preciso organizar uma assembleia estatuinte que coloque em discussão a necessidade de eleições democráticas para que diferentes propostas possam sem abertamente construídas, debatidas e votadas. Dessa forma, é possível reorganizar e rearmar o movimento estudantil na Psico/UFRGS.Nós da Juventude Faísca Revolucionária nos colocamos a serviço dessa batalha, como parte de reerguer o movimento estudantil, para que cada voz sufocada possa expressar o ódio contra esse sistema e encontrar formas de se organizar e lutar contra os ataques.




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