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Meio Ambiente | Vaca Muerta: ecocídio na Argentina apoiado por Lula e o empresariado industrial gaúcho

Após Lula anunciar que o BNDES irá financiar a expansão dos gasodutos para aumentar a produção da jazida ecocida de fracking de Vaca Muerta, que avança sobre territórios do povo indígena Mapuche na Argentina, o empresariado industrial gaúcho reunido na FIERGS debateu com o embaixador argentino, o peronista Daniel Scioli, a possibilidade de importação do gás natural de lá para o Brasil.

sábado 11 de março de 2023 | Edição do dia

Desmentindo os discursos “verdes”, Fernández aposta todas as fichas no extrativismo ecocida, com o pleno apoio do novo governo Lula, em benefício dos capitalistas industriais, banqueiros e petroleiras imperialistas. A grande promessa de Alberto Fernández para aumentar as exportações da Argentina é a conclusão do “Gasoduto Néstor Kirchner”, cuja inauguração é estimada para junho e que conta com US$ 689 milhões em financiamento do BNDES anunciados por Lula.

O presidente argentino declarou que “com este gasoduto poderemos continuar com a expansão da produção de Vaca Muerta. Nos próximos anos, veremos recordes de produção de gás e petróleo. Muito provavelmente cada ano signifique um novo recorde” e que “isto significará não só capacidade de auto-abastecimento, como também de exportação”. Nesse sentido, no último dia 2 de março, o embaixador argentino, Daniel Scioli, se reuniu com a Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (FIERGS) para debater a entrada do gasoduto no Brasil pela cidade de Uruguaiana.

Enquanto para os capitalistas e seus representantes trata-se de mais uma oportunidade de enriquecimento, para as comunidades indígenas mapuche da patagônia este projeto é motivo de uma histórica luta contra a usurpação de seus direitos, a usurpação de seus territórios e a contaminação ambiental. Para a construção de refinarias, os mapuche foram expulsos de suas terras, como foi o caso emblemático da comunidade de Lof Campo Maripe. Enquanto o extrativismo é propagandeado pelo governo como uma das maiores fontes de riqueza da Argentina, as comunidades do seu entorno não têm gás natural nem água potável, nem hospitais nem escolas para acompanhar o crescimento populacional.

Apesar de toda a demagogia do governo Lula sobre a questão ambiental, o projeto de país petista e seus reflexos na política externa não são alternativa para todo negacionismo e devastação bolsonarista. Lula, junto de Alckmin, Marina Silva e também do PSOL com Sônia Guajajara, aperta as mãos com aqueles que sistematicamente financiam e promovem, direta ou indiretamente, casos como Brumadinho e Mariana, casos de trabalho escravo mascarado de terceirização, casos como o massacre ao povo Yanomami, tudo em nome da governabilidade capitalista, em nome de conter a luta de classes desviando o descontentamento com a extrema-direita bolsonarista para falsas saídas institucionais, mantendo as bases de um modelo extrativista, agroexportador e semi-colonial.

A reserva de Vaca Muerta, na Argentina, é uma formação geológica rica em gás e óleo de xisto, que requer para sua extração um processo considerado muito danoso ao meio ambiente, o “fracking”, ou fraturamento hidráulico. Essa prática é realizada por meio da injeção de água em alta quantidade e pressão, junto a mais de 400 produtos químicos e muita areia. A pressão provoca o fraturamento da rocha, permitindo que o gás natural e petróleo armazenado seja recuperado pelas fissuras criadas. O fraturamento hidráulico oferece grandes riscos às águas subterrâneas e de superfície, à fauna, flora, agricultura, pecuária e, especialmente, à saúde das populações atingidas. Um estudo norte-americano de 2011, por exemplo, associou a contaminação da água pela atividade do fracking a denúncias de casos tão severos que a água da torneira de algumas residências se tornou inflamável.

Além da degradação do solo e da água, fenômenos sísmicos também são provocados pelo fraturamento subterrâneo e vem sendo ocultados pelos governos argentinos e as multinacionais. Como afirma o La Izquierda Diario argentino, jornal irmão do Esquerda Diário, a indústria de hidrocarbonetos da província de Neuquén, onde se encontra Vaca Muerta, registrou cerca de 9242 acidentes ambientais de 2015 a 2022 - uma herança de Macri continuada por Alberto Fernandes. Uma média de 5,6 acidentes por dia, entre eles: derrames de óleo, de água de produção, de fluidos com concentração de hidrocarbonetos, de lodo, de diesel, de produtos químicos, de óleo hidráulico, de lubrificantes, combustíveis e óleos refrigerantes, fuga de gases, princípios de incêndio (com acidentes que provocaram chamas de 30 metros) e “blow out” - quando se perde totalmente o controle dos poços e há liberação descontrolada de óleo e gás.

Explorando os mais de 1145 poços operativos de Vaca Muerta estão as empresas Chevron (Estados Unidos), Exxon Mobil (Estados Unidos), Dow Chemical (Estados Unidos), Total (França), Wintershall (Alemania), Shell (Reino Unido), PAE (CNOC da China e a britânica BP), Vista (México), e as argentinas YPF, Phoenix Global, Medanito, Pampa Energía, Pluspetrol, Capex, Tecpetrol e outras. As empresas não declaram a totalidade da área de superfície que contaminam nem o volume das fugas de gás para a atmosfera, que só entre 2017 e 2021 foram mais de 1200. Em sua maioria são vazamentos de gás metano sem combustão, muito mais poluente que o queimado.

O gasoduto de 500 km que o Brasil vai financiar permite conectar o estado argentino de Misiones com o Rio Grande do Sul, aumentando o escoamento da produção. O fracking de Vaca Muerta estava com um gargalo para aumentar a produção: ou exigia a criação de uma cara e complexa planta de liquefação para exportar o gás em forma líquida, ou exigia algum aumento de demanda. O Brasil - que pode melhor utilizar gás do pré-sal que é queimado por falta de gasodutos - prefere ajudar a indústria extrativista, anti-indígena e mais poluidora do país vizinho a vencer seu “gargalo” para produzir mais e poluir mais. Cabe colocar também que a exploração do gás de xisto por meio do fraturamento hidráulico não é regulamentada no Brasil, e movimentos sociais como a ARAYARA.org e a Coalizão Não Fracking Brasil pelo Clima, Água e Vida (Coesus) levantam uma campanha há mais de 10 anos contra a instalação dessa atividade no país e também vêm denunciando o projeto de investimento do novo governo brasileiro na Argentina.

No aspecto econômico, porém, tão utilizado pelos governos, a mídia burguesa e os capitalistas para justificar seus projetos, a necessidade argentina de exportação da produção de Vaca Muerta como um fim desejável em si mesmo esconde o destino das divisas obtidas com essa venda. Nos últimos anos, o governo argentino baixou e congelou a taxação dos lucros das petroleiras enviados para fora do país: um presente para as multinacionais que despejam milhões de dólares em paraísos fiscais. Outro aspecto é o peso da dívida pública na política econômica argentina, praticamente co-governada pelo FMI, o que leva a que o valores arrecadados com o extrativismo sejam embolsados pelos grandes banqueiros e especuladores nacionais e internacionais da dívida argentina, e não investidos em saúde, educação, moradia, emprego, uma transição energética verde real e outras necessidades urgentes dos trabalhadores e do povo pobre.

Para enfrentar a devastação ambiental promovida pelo capitalismo na América Latina, principalmente pelo imperialismo e suas multinacionais bilionárias, que lucram bilhões com nossos recursos naturais sem nenhuma preocupação com os impactos de suas atividades, é preciso levantar a bandeira da expropriação e estatização das empresas do setor energético sob controle dos trabalhadores e da população, abrindo caminho para uma atividade produtiva voltada às necessidades sociais e não ao lucro, permitindo uma relação harmônica com a natureza - impossível no capitalismo. Nesse sentido, desde o Brasil ecoamos o que os companheiros da vanguarda dos trabalhadores, estudantes e do povo pobre reivindicam em Neuquén: pela abolição do fracking, estatização das grandes indústrias do petróleo sob gestão dos trabalhadores e controle operário da população, de forma a avançar para uma verdadeira transição energética ecologicamente sustentável. Todo repúdio ao acordo ecocida de Lula e Fernández em benefício dos lucros capitalistas!




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