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COLUNA
O “pequeno” entrave da uberização
Iuri Tonelo
Recife
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Nos últimos dez anos, assistimos duas importantes crises na trajetória do capitalismo em escala internacional: a crise de 2008, chamada de Grande Recessão, que colocou em questão os longos anos de hegemonia neoliberal internacional, levando a emergência de maiores tensões geopolíticas, discursos nacionalistas, mudanças na ideologia do “globalismo”, entre outras; e também vivenciamos, no último ano, uma importante recessão econômica mundial, dessa vez deflagrada pela pandemia do Covid (com todos os contornos de uma catástrofe social).

Do ponto de vista da relação capital trabalho, tendo como primeiro epicentro a Europa, sobretudo Grécia e Espanha, continuou-se muito da obra neoliberal, com os planos de austeridade, em seguida as reformas da previdência e trabalhista - para anos depois esses ataques se generalizarem ao redor do mundo –, aproveitando-se inclusive das contradições sociais da recessão para aprofundar a exploração, com destaque para o tema da precarização do trabalho dos imigrantes. Mas não foram só os velhos métodos neoliberais os implementados, buscou-se “inovar”: mudanças na esfera da produção com maior controle do trabalho a partir da indústria 4.0, aprofundamento da robótica e inteligência artificial na esfera laboral e introdução de tecnologias de informação e comunicação, no fenômeno chamado de uberização.

Pois bem, parecia uma solução fantástica para o capital, aumentar a robotização, controlar melhor o trabalho e uberizar os serviços de conjunto. Com isso reduziria o número de trabalhadores e os controlaria pelas tecnologias de machine learning, algoritmos e plataformas, empregando os mínimos recursos e absorvendo a maior rentabilidade possível. Direitos trabalhistas? Nenhum, afinal são “empreendedores”. Resistências e greves? Não mais, no capitalismo do século XXI você pode controlar cada trabalhador pelo aplicativo, e estar seguro que cada um “busca o seu” e que estaria esgotada e envelhecida a noção de classe nesse modelo. E como os gestores do capital são obstinados em suas ideias, buscaram implementar esse processo em larga escala, particularmente no setor de serviços.

Só tinha um pequeno entrave para generalizar a uberização, uma peça com defeito: os próprios trabalhadores. Mas eles não são empreendedores, buscando seu espaço individual, entendendo essa nova dinâmica com seus parceiros nas plataformas? Não, os trabalhadores não estão entendendo nada disso, ou pelo menos uma parcela deles começa a não entender e pensar de outra forma.

Ou vocês gestores acharam que iriam deixar um jovem numa bicicleta na chuva e no sol escaldante e ele iria se manter igual um robô acreditando que é um empreendedor? Ou vocês acharam que iriam pagar 20 reais pra limpeza de uma trabalhadora doméstica uberizada e querer que ela esquecesse do passado escravista do Brasil? Ou vocês acharam que iriam contratar professores por plataforma e que eles perderiam sua identidade coletiva de educadores, sem buscar formas criativas de se unir pelos seus direitos?

Os últimos dias reafirmaram essa contradição: no Brasil, nesta terça-feira houve manifestações de motoristas da Uber, 99, Ifood, no Rio de Janeiro, em Porto Alegre, Distrito Federal e outros estados, ainda um pouco confusas em suas manifestações, falando em fim das "promoções" nos apps, reivindicando "aplicativos mais justos", o que no fundo são formas de questionar a exploração das empresas, embora ainda não de forma clara . Na semana passada, a Uber sofreu uma derrota jurídica no Reino Unido com a Suprema Corte considerando esses funcionários como trabalhadores da empresa, devendo gozar de salário mínimo e férias remuneradas.

Como diria aquele verso de Bertolt Brecht “O homem, meu general, é muito útil:/ Sabe voar e sabe matar/ Mas tem um defeito/ – Sabe pensar.” Parece que os robôs, a inteligência artificial e as tecnologias de informação e comunicação ainda não conseguiram resolver esse “defeito” na classe trabalhadora.
E não vão conseguir...

 
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