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Genocídio na Palestina | Conheça o capitalista que está lucrando milhões com os palestinos que tentam fugir de Gaza

Enquanto segue a ofensiva sionista contra o povo palestino na Faixa de Gaza, revelando diariamente novos níveis de atrocidades, centenas de milhares de palestinos buscam desesperadamente escapar da morte certa. Contudo, na fronteira sul da Faixa, a única onde há alguma possibilidade de travessia, as maquinações internacionais da opressão imperialista e aqueles que dela lucram ergem uma muralha diante da população que aguarda um banho de sangue com a vindoura invasão israelense da última cidade ainda de pé em Gaza.

segunda-feira 6 de maio | Edição do dia

Quanto se estaria disposto a pagar para escapar de um genocídio? E da fome? Das doenças, de sucumbir à exaustão, à desidratação, à desnutrição? Quando se estaria disposto a sacrificar para garantir que sua família esteja segura? Sua própria vida? Sua terra? E o que acontece depois? Será que a segurança sequer é uma opção? Tratam-se questões que, para o povo palestino, tornam-se mais concretas e urgentes a cada dia desde o início, há mais de 200 dias, da ofensiva de limpeza étnica da Faixa de Gaza pelo Estado israelense.

Cenas como os massacres da farinha que se desenrolaram à poucos meses na região central de Gaza ilustram a proporção do que significa, para o povo palestino em Gaza, tentar garantir o mínimo para si mesmos e aqueles que amam. Este é especialmente o caso no atual momento, em que os colonizadores sionistas preparam uma tragédia que pode fazer tudo que transcorreu até agora parecer pequeno em comparação. No entanto, para alguns, como o mercenário egípcio Ibrahim al-Organi, proprietário da empresa Hala Consulting and Tourism, trata-se não de um presságio sombrio, mas de uma oportunidade de lucro.

Rafah, uma tragédia anunciada

A cidade de Rafah fica localizada no extremo-sul da Faixa de Gaza, a apenas alguns quilômetros da fronteira com o Egito. No últimos meses, ao longo da extensa agressão e continuado massacre perpetrado pelo Estado israelense contra Gaza, esse território tornou-se inundado de tendas de refugiados se estendendo até o muro que marca a fronteira. O influxo de refugiados internos já tornou Rafah uma das cidades mais populosas do mundo, abrigando um número estimado de 1,7 milhão de palestinos. Assediada diariamente por bombardeios, inclusive sobre áreas de tendas, e assistindo o sobrevoo diário de drones de reconhecimento israelenses, Rafah se arrasta para uma tragédia anunciada: uma iminente invasão terrestre que, se levada a frente, representaria um dos mais sangrendos massacres do século XXI. Anunciada há semanas, sem nenhum sinal de retrocesso pelo governo sionista, a entrada de tropas terrestres na última cidade remanescente de Gaza - cujo restante do território encontra-se em tal estado de destruição que estima-se que levaria mais de 14 anos para remover todas as 37 milhões de toneladas de escombros - representaria uma verdadeira Solução Final na limpeza étnica da Palestina sonhada lascivamente pelos genocidas israelenses. As cifras da atual campanha genocida em Gaza já ultrapassam os números da Nakba de 1948, sendo 70% das vítimas mulheres e crianças. Entre domingo, 05/05 e segunda 06/05, denúncias se multiplicaram de panfletos do exército israelense jogados sobre Rafah, anunciando a iminência da invasão e instando, hipocritamente, a população civil a “evacuar”.

A agressão militar a uma população completamente indefesa em Rafah, que, diferente de todos os ataques a grandes cidades até agora, não teriam sequer mais para onde fugir das tropas vindouras, espremidos entre as hordas genocidas e a fronteira egípcia, seria catastrófica. O Estado israelense faz de tudo para garantir esse cenário. Pouco depois dos israelenses receberem mais um carregamento de armas de Biden, um oficial ocidental de alto escalão revelou ao jornal Middle East Eye, sob condição de anonimato, que a IDF monta em “cordão de checkpoints” ao redor de Rafah, com o propósito explícito de impedir a fuga de palestinos.

Segundo a denúncia, os checkpoints bloquariam a saída de “homens em idade militar”, um critério no mínimo pouco confiável para o Estado que julga crianças de 12 anos em tribunais militares e as encarcera como “terroristas” em prisões condenadas por organismos internacionais de Direitos Humanos. Mulheres, crianças e idosos talvez consigam escapar do banho de sangue pelos checkpoints - uma perspectiva que tem pouca esperança quando se imagina a cena de filas enormes de refugiados desesperados, onde amontoariam-se quase dois milhões de pessoas, diante de soldados que nos últimos meses alegremente abriram fogo até contra pessoas ao redor de caminhões de ajuda humanitária, para não falar do precedente estarrecedor dos checkpoints israelenses na Cisjordânia, onde não é incomum um civil desarmado ser executado sem explicação ou uma mulher grávida ser forçada a dar a luz por ser impedida de chegar ao hospital. Todos que não conseguirem sair de Rafah serão tratados pelo exército israelense como “combatentes”, e massacrados. Os que conseguirem serão deixados para fugir a pé de volta para as ruínas do resto de Gaza, em meio a um calor que já ceifou várias vidas devido à exaustão e desidratação, e para escaparem dos bombardeios, caminhando entre covas coletivas, além dos soldados, que admitidamente estabeleceram em Gaza “zonas da morte”, conhecidas apenas por eles, onde snipers matam qualquer um que entre.

Enquanto se monta a antecipação diante do massacre iminente, multiplicam-se casos de algo que só poderia ser descrito como agressivamente distópico: em complemento a um genocídio transmitido ao vivo, perpetrado por criminosos de guerra com perfis no TikTok, palestinos desesperadamente criam “vaquinhas”, GoFundMe, etc na esperança de obter recursos suficientes para escapar de Gaza. Nas redes sociais, pessoas presas em Rafah imploram por doações que as permitam fugir, enquanto mundo afora parentes que já escaparam tentam freneticamente conseguir quantias muitas vezes superiores que a soma de todas as suas economias para garantir a sobrevivência de suas famílias.

Mas como, exatamente, se faz para fugir de Gaza? Considerando que a agressão militar israelense escorre do norte de Gaza rumo ao sul e que a totalidade dos limites que separam a Faixa do restante do território palestino ocupado, segundo as fronteiras definidas em 1967, é completamente murado e fortificado, a resposta seria, necessariamente, pelo Egito. Diferente, porém, das massas trabalhadores e populares de todo o mundo árabe, inclusive as egípcias, que expressam profunda identificação e solidariedade com o povo palestino e têm saído incessantemente às ruas de seus países exigindo um fim ao genocídio, o governo egípcio - atualmente uma ditadura militar sustentada pelos EUA - não tem o menor interesse nem em impedir uma invasão a Rafah (tendo até agora negociado com israel apenas que a agressão não ultrapasse suas fronteiras) nem em acolher os refugiados palestinos. Pelo contrário: desde o início do genocídio, todo esforço do Estado egípcio tem sido em bloquear qualquer fluxo de pessoas tentando fugir do massacre, inclusive fortificando suas fronteiras e mesmo obstaculizando a entrada de ajuda humanitária através da passagem fronteiriça.

No sistema capitalista, porém, mesmo (ou, talvez, especialmente) em meio a um genocídio, há, por todos os lados, dinheiro a ser ganho. A indústria bélica americana embolsa quantias inimagináveis vendendo as bombas que os israelenses usam para destruir escolas, hospitais e prédios residenciais. A economia israelense engorda com os lucros de sistemas computadorizados de monitoramento e assassinato, testados no povo palestino e revendidos mundo afora, assim como encontra capacidade produtiva não só para fornecer armas de chacina para seu próprio exército, como para outros Estados usarem contra suas próprias populações (inclusive no Brasil, onde acaba de ser aprovado o uso de R$ 900 milhões do Novo PAC de Lula para comprar veículos militares israelenses). E, junto a tudo isso, mais um setor lucra e muito bem com a crise em Gaza: a indústria da fuga para o Egito!

O dono do Sinai

Ibrahim Gomaa Salem Hassan al-Organi é um empresário com uma longa e complexa história, que se mistura à própria história recente do Egito. É, desde a primeira década dos anos 2000, uma importante liderança das milicias tribais da região da Península do Sinai, que ganharam renovada relevância e proximidade com o Estado egípcio após o golpe militar no qual o atual presidente, Abdel Fattah el-Sisi, tomou o poder no país, depondo o governo que havia sido democraticamente eleito após a queda do ditador Hosni Mubarak, em meio à Primavera Árabe em 2011. Sob a liderança de Organi - que tinha décadas de experiência, inclusive militar, na área, atuando com contrabando e outras atividades ilegais, além de articulações políticas de grupos locais - a chamada União das Tribos do Sinai opera em proximidade com o Estado egípcio em “operações de segurança” - um ponto de apoio para a expansão do império comercial de Organi, que hoje já de encontra em ramos tão diversos quanto “construção, mineração, viagens, hotelaria e segurança privada”, segundo o Middle East Eye.

Na passsagem entre Gaza e o Egito, é a Hala Consulting and Tourism, propriedade do Grupo Al-Organi, quem tem mantido controle exclusivo sobre a travessia em Rafah pelo menos desde fevereiro.

Palestinos falando à Sky News relatam que, previamente ao início do massacre, diversas firmas atuavam na região de Rafah essencialmente trabalhando como “despachantes” garantindo em alguns dias, em troca de algumas centenas de dólares, as autorizações necessárias para atravessar a fronteira, que poderiam levar “semanas ou meses” para serem obtidas pelos canais normais. Desde a invasão e o fechamento da fronteira pelo Estado egípcio, no entanto, os preços escalaram meteóricamente. Consultados pelo Middle East Eye, fontes palestinas e egípcias relataram que, até o começo de 2024, “vários intermediários estavam envolvidos na coordenação da saída dos palestinos, de forma despreparada e descentralizada”, com valores podendo chegar a “até US$ 11 mil”. Desde fevereiro desde ano, no entanto, apenas a Hala segue operando - a única intermediária para a obtenção das “autorizações” necessárias à travessia para o Sinai. Testemunhos locais e anúncios online identificados pela Sky News apontam para um preço de US$ 5.000 para adultos e US$ 2500 para menores de 16 anos pela travessia.

Estimativas do Middle East Eye e da Sky News, baseadas em listas de travessias diárias e nos preços médios cobrados pela Hala estimam que a empresa chegue a lucrar US$ 2 milhões por dia com palestinos tentando escapar do genocídio.

Segundo uma reportagem do jornal britânico The Times, o Hamas, que governa a Faixa de Gaza, bem como o governo do Egito, negam a existência do sistema de pagamento para evacuações. No entanto, ainda segundo a reportagem, a Autoridade Geral para Travessias e Fronteiras, do governo de Gaza, teria intervido diretamente no último mês junto às autoridades fronteiriças egípcias para “reservar” um horário específico para “clientes” da Hala atravessarem a fronteira “entre 8h e 10h da manhã”. Tudo aponta no sentido de que a presença de Organi seja não só conhecida, como muito bem embrenhada na política e economia da travessia.

Cada derramamento de sangue, uma oportunidade

E a história de Organi lucrando com o genocídio do povo palestino não é de agora. Em 2012, a Sons of Sinai, outra empresa de seu conglomerado, atuou como parte dos esforços de reconstrução de Gaza após o devastador assédio israelense. A cada nova onda de destruição sionista derramada contra o povo de Gaza, a empresa de Organi ganhava mais espaço, eventualmente monopolizando o transporte de bens que entram e saem da Palestina pela passagem de Rafah. Com a conivência do governo egípcio, esse controle atualmente se faz sobre comboios de ajuda humanitária, com uma instituição de caridade denunciando ao Middle East Eye ter sido forçada a pagar uma “taxa de gerenciamento” de US$ 5.000 por caminhão para que pudesse entregar os mantimentos. Em 2021, após mais um ataque israelense contra Gaza, Organi recebeu US$ 500 milhões em um contrato firmado pelo governo egípcio, para participar das obras de reconstrução.

Desde 2022, Organi é membro da Autoridade de Desenvolvimento do Sinai, agência estatal responsável, entre outras coisas, pela autorização e monitoramento das atividades de construção na região. A nomeação, feita pelo presidente Sisi, dá ao empresário o direito exclusive de aprovar seus próprios empreendimentos e de seus potenciais concorrentes.

No início de abril, o Estado prendeu ativistas que protestavam contra Organi e denunciavam suas empresas por lucrarem com o sofrimento de palestinos. Por participarem de protestos, indivíduos foram detidos sobre acusações que iam desde “espalhar notícias falsas” até “colaborar com grupos terroristas”. O caso vai no mesmo sentido dos inúmeros relatos de delatores que falaram de Organi e suas atividades a meios da imprensa investigativa: seus crimes não apenas são encobertos e protegidos pelo governo egípcio, como este ativamente intervém contra seus opositores. “Eles vão prender a mim e à minha família se souberem que falei com você. Tenho medo deles – você não sabe o quão brutais eles são.”, relatou à Sky News um palestino que recentemente conseguiu a evacuação de seu pai através da Hala.

A empresa de Organi não está consta publicamente como registrada junto ao Ministério de Antiguidades e Turismo do Egito - teoricamente uma obrigação para todas as empresas que realizam travessias de fronteira. Mesmo assim, filas enormes com centenas de pessoas carregando dinheiro vivo formam-se diariamente, há meses, em frente à sede da Hala no Cairo, com pessoas desesperadamente tentando pagar pela evacuação de parentes em Gaza. Em uma ocasião, a polícia teria ido ao local para reprimir a multidão.

Organi e o imperialismo no mundo árabe

Organi e seu grupo de empresas não são obscuros no Egito. Além de possivelmente o mais influente empresário da região do Sinai, Organi é um capitalista peso pesado no país. Seu conglomerado é o principal patrocinador do time de futebol Al-Ahly, um dos maiores do continente africano, que exibe orgulhosamente o logo do grupo na frente de seus uniformes. Além disso dirige o showroom da BMW no Cairo. Para além das fronteiras egípcias, suas empresas estiveram envolvidas em contratos multimilionários de construção na Líbia, onde Organi foi visto ao lado do filho do comandante do leste da Líbia, aliado de Sisi, Khalifa Haftar. Tem ligações, também, com o programa Vision 2030 do príncipe herdeiro saudita Mohammed bin Salman.

Nada disso deve surpreender, em especial suas ligações com importantes peões do imperialismo no mundo árabe, dada sua própria origem enquanto extensão da ditadura militar egípcia que é, em si própria, um agente da hegemonia americada contra os povos do norte da África. De fato, todo o histórico de Organi no Egito e em sua relação com Gaza o preparou para cumprir esse papel, por sua vez uma extensão do papel cumprido pelo Estado egípcio e pelos diferentes governos árabes da região: o de contenção da crise criada pelo Estado israelense; de normalização do massacre, às custas do derramamento de sangue palestino. É um exemplo gráfico de como, enquanto transcorre diante de nossos olhos, transmitido ao vivo para todo o mundo assistir, um evento histórico de uma geração - a destruição completa de Gaza e a chacina desmedida de dezenas de milhares de inocentes - o sistema capitalista segue funcionando normalmente, suas engrenagens seguem rodando, tudo, em todos os lados, até a mais profunda tragédia humana, é fagocitado por sua lógica. E mesmo o dinheiro doado em boa fé para ajudar no resgate imediato de seres humanos que encaram a morte certa faz seu caminho de volta para os bolsos daqueles responsáveis pela criação da tragédia.

Os senhores da guerra

A história de al-Organi, no entanto, não deve ser vista apenas como a de um “empresário malvado”, atuando corruptamente e se valendo, por interesse próprio, do sofrimento de centenas de milhares de seres humanos para enriquecer. Como pontuou Mohannad Sabry, analista de segurança e especialista em Sinai, ao Middle East Eye, “Organi não é pessoalmente responsável pela travessia de Rafah e por estabelecer o monopólio sobre o movimento através dela. Ao controlar o terminal, ele está representando uma política de Estado”. Esta política, segundo o analista, é de “ganhar dinheiro com a situação terrível em Gaza”: “O Estado está terceirizando esse negócio para alguém que possa fazer isso em seu nome. Organi é uma fachada. Ele é um nome. Pode ser substituído a qualquer dia”, disse. De fato, o drama da travessia de Rafah é só a faceta mais evidente de uma questão estrutural inescapável: o Estado egípcio, como tantos outros Estados árabes e suas burguesias, não apenas é conivente com o genocídio em Gaza, como lucra com ele, em suas relações com o imperialismo que nada têm a ver com os interesses dos povos da região.

Iríamos, inclusive, um passo além em ressaltar que, tal qual Organi não é um “gênio do mal”, mas uma manifestação particularmente degenerada do sistema político egípcio e sua relação predatória tanto com as populações tribais do Sinai quanto com o povo palestino de Gaza, esta política estatal egípcia, por sua vez, não pode ser entendida apenas pela lente dos atores envolvidos nas disputas de poder nacionais, sem do contexto maior de como o sistema capitalista a nível global (em particular por meio do imperialismo americano e seu “porta aviões inafundável” - a colônia etnonacionalista de israel) mantém sobre os povos do Oriente Médio uma malha total de opressão, ao mesmo tempo que encontra, a cada momento, novas formas de lucrar com os níveis inomináveis de sofrimento com base nos quais mantém sua dominação sobre a região.

Atualmente, diante da crescente penumbra da invasão de Rafah, palestinos relatam rezar apenas para que os preços da travessia baixem ou que suas vaquinhas on-line consigam arrecadar os fundos necessários, algo mais do que justificável frente à urgência da situação e o medo da barbárie sionista. Algumas vozes, na Palestina e fora dela, vão um pouco além, em exigir (corretamente), que a passagem de Rafah seja aberta - tanto para a entrada de ajuda quanto para a circulação de pessoas - denunciando a culpabilidade egípcia na limpeza étnica de Gaza, ao colaborar com o Estado israelense em tornar o pior possível a situação do povo palestino no enclave.

Há, porém, uma questão de fundo que não pode ser esquecida: a fonte última deste sofrimento é, essencialmente, a existência do Estado israelense enquanto projeto colonial e genocida, amparado pelas maiores potências imperialistas como bastião da opressão aos povos do Oriente Médio. Enquanto dezenas de milhares de palestinos desesperadamente buscam fugir da morte certa, não está perdido da memória coletiva deste povo que, tal qual em 1948, fugir de sua terra pode significar nunca mais ter como retornar. A comunidade diaspórica palestina, em seus mais de 6 milhões de pessoas espalhadas pelo mundo, mas largamente concentrada em países árabes, inclusive o próprio Egito, é composta em grande medida por aqueles que, após serem expulsos de suas terras pelo nascente Estado sionista durante a Nakba, acreditavam que conseguiriam ainda retornar, e passaram as décadas seguintes assistindo a desstruição de seu país, sem chance de voltar para reconstruir o que foi perdido.

De fato, o direito de retorno dos refugiados palestinos é um dos pontos aos quais não só os sanguinários de Tel-Aviv, como o conjunto da mal chamada “comunidade internacional” ergueram históricamente maior oposição.

Enquanto é absolutamente justa a denúncia e a reivindicação pelo direito do povo de Gaza de escapar em segurança do massacre - especialmente quanto este direito é embarreirado de forma tão clara em um ponto específico, inclusive em uma pessoa específica, com claros interesses pessoais por trás de lucrar com o banho de sangue - esta luta deve ser combinada à necessidade de frear a todo custo a invasão de Rafah; à remoção imediata de todas as tropas de Gaza, com garantia de entrada de suprimentos para a reconstrução das cidades, o que só poderá se dar mediante a derrubada dos que enchem os bolsos com as notas encharcadas de sangue palestino; e, finalmente, ao desmantelamento da entidade colonial sionista, pelo estabelecimento de uma Palestina única e livre, do rio ao mar, garantindo o direito de retorno aos milhões de refugiados e pondo abaixo a ingerência imperialista sobre a região!

Para nós, revolucionários, esta luta só pode ser levada até o final, necessariamente, com a classe trabalhadora à frente, unificando as massas trabalhadoras e populares do mundo árabe e junto aos trabalhadores não sionistas do Estado israelense, que compreendem o caráter fundamentalmente injusto de seu Estado de apartheid e se juntam à luta pelo seu desmantelamento. Igualmente, por abaixo um enclave militar da maior potência imperialista mundial exige, necessariamente, que os trabalhadores tomem em suas mãos o controle da produção, que interrompam todas as cadeias de abastecimento da ordem vigente, que reproduz e lucra com as situações de opressão e sofrimento extremos, e reordenem a sociedade de acordo com as necessidades das grandes maiorias, rompendo com o imperialismo e os governos e burguesias que operam como seus agentes locais! Sendo assim, a luta por uma Palestina Livre é, necessariamente, a luta por uma Palestina Operária e Socialista, uma luta que não pode ficar contida apenas à Palestista, ou mesmo ao Oriente Médio, mas é necessariamente atravessada também pela luta dos trabalhadores no centro imperialista, que já têm dado mostras de sua solidariedade ao povo palestino, contra seus próprios governos que apoiam o genocídio!

Tudo isso, especialmente no momento atual, pode parecer muito distante. A urgência da situação pode, aparentemente, deixar pouco espaço para pensar um programa tão “ousado”. Mas não apenas é o caso que, justamente uma situação tão aguda mostra como qualquer coisa menos que uma solução radical, que “aguarre o problema pelas raízes”, não será uma verdadeira e duradoura solução, como também é importante importantíssimo falar da luta internacional em defesa do povo palestino e por uma Palestina Livre não é, nem de perto, algo meramente teórico. Por todo o mundo, desde o início do genocídio, massas tomam as ruas em menifestações massivas. Por todo o mundo árabe, cai a máscara dos regimes burgueses coniventes com o imperialismo americano e a opressão israelense, abrindo caminho para a organização das massas árabes em suas próprias organizações de classe. E neste exato momento, nos EUA, na Austrália e em vários países da Europa, estudantes ocupam universidades em protestos fortíssimos em solidariedade ao povo palestino! Estes estudantes amedrontam os governos imperialistas, que enviam multidões de policiais para agredir e atacar os manifestantes pacíficos. Multiplicam-se fotos e vídeos de universidades americanas com snipers montados em prédios próximos, e nos últimos dias foram marcados por uma brutal repressão contra o acampamento da Universidade de Columbia. Mesmo assim, a solidariedade com os manifestantes segue firme e os acampamentos segue firme, inclusive com professores se somando à greve estudantil!

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Dia após dia, de formas que antes não se pensaria possíveis, o sistema capitalista mostra, em Gaza, pelas mãos ensanguentadas dos carniceiros da IDF, que é capaz de impor condições de brutalidade e desumanidade atrozes em nome de manter seu controle. Afogam em sangue o povo de Gaza porque o objetivo estratégico da limpeza étnica da Palestina e o estabelecimento pleno do Estado colonial, representante do imperialismo americano e europeu no Oriente Médio é um que perseguem, e perseguirão a qualquer preço. Por outro lado, longe de um estado de excessão, tudo sobre o genocídio em Gaza, desde as bombas, os sistemas de IA que guiam os massacres, até os mercenários enriquecendo com o controle das fronteiras, são peças muito bem integradas às maquinações mundiais da economia capitalista e da opressão imperialista. Há mais de 100 anos do profético epiteto de Lênin sobre a época imperialista do capitalismo como “época de crises, guerras e revoluções”, que no que diz respeito às primeiras duas, se mostra mais atual do que nunca, é urgente trazer ao presente também a luta reoluvionária da nossa classe, única capaz que por fim à barbárie.




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