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Formação Política | MRT em São Paulo debate a Teoria da Revolução Permanente à luz da Palestina

No dia 19 de fevereiro, o Movimento Revolucionário de Trabalhadores (MRT), que impulsiona no Brasil a rede internacional do Esquerda Diário, realizou uma formação teórica sobre a Teoria da Revolução Permanente (TRP) na atualidade e a luta do povo palestino. Nela, participaram militantes da Capital de SP, ABC e Campinas, dentre eles: estudantes de distintas universidades e trabalhadores de diversas categorias. Na atual conjuntura, a retomada das lições de nossa classe e da luta revolucionária são fundamentais para a análise e intervenção na realidade.

terça-feira 27 de fevereiro | 15:39

No dia 19 de fevereiro, o Movimento Revolucionário de Trabalhadores (MRT), que impulsiona no Brasil a rede internacional do Esquerda Diário, realizou uma formação teórica sobre a Teoria da Revolução Permanente (TRP) na atualidade e a luta do povo palestino.

A exposição foi conduzida por André Barbieri e Bruno Gilga. Nela, participaram militantes da Capital de SP, ABC e Campinas, dentre eles: estudantes de distintas universidades e trabalhadores de diversas categorias, desde o metrô e professores até trabalhadores da USP e terceirizados. O objetivo da discussão foi entender o processo de formação da grande estratégia da revolução mundial, partindo da evolução na concepção do permanentismo em Marx até Trotski, à luz dos problemas democrático-estruturais na questão palestina, o caso mais selvagem do colonialismo capitalista no século XXI. Muito além dos fundamentos teóricos chave para a teoria da revolução permanente, desenvolvidos entre 1905 (em sua primeira formulação) até sua generalização entre 1929-1930 como teoria integradora do Oriente e do Ocidente, a atenção estava centrada em responder a pergunta de se a TRP tem “algo a dizer” sobre um problema candente da atualidade, em meio ao genocídio do Estado sionista de Israel contra os palestinos em Gaza. Numa situação marcada pela crise mundial e a elevação das tendências militaristas, com a Guerra da Ucrânia entrando em seu terceiro ano e representando o questionamento da velha ordem neoliberal comandada pelos Estados Unidos, cumpre encarar a teoria revolucionária (sem a qual, segundo Lênin, é impossível haver movimento revolucionário) em toda a sua vitalidade para pensar os problemas estruturais para os quais o capitalismo não oferece nenhuma solução. A questão Palestina está no centro das atenções do mundo, assim como teve papel relevante na conjuntura política brasileira. O programa burguês que se postula como alternativo ao puro massacre levado adiante por Netanyahu (sustentado por Joe Biden e o imperialismo internacional), o dos dois Estados, se provou uma e outra vez categoricamente fracassado, diante da impossibilidade de um Estado palestino independente com a permanência do colonialismo sionista e da estrutura de poder comandada pelos Estados Unidos no Oriente Médio. Que tipo de programa - ligado a que estratégia - poderia dar uma solução à convivência harmônica de árabes e judeus no território histórico da Palestina? A TRP oferece um tesouro estratégico e programático inestimável.

O desenvolvimento da Teoria da Revolução Permanente de Trótski se deu a partir dos balanços e lições de 5 revoluções, perpassando os séculos XVII, XIX e XX, sendo elas: a Revolução Francesa, em que a burguesia assume um papel dirigente na revolução para derrubar o antigo regime absolutista e feudal e impor a sua ditadura; a Primavera dos Povos de 1848, uma onda de revoltas que assolou a Europa e partiram de demandas democráticas, de unificação nacional e luta contra as monarquias e a aristocracia do Antigo Regime, na qual o proletariado se insurgiu em armas e ao lutar pelas demandas democráticas, em alguns lados junto à burguesia liberal, como na França, também realizava incursões sobre o direito de propriedade da burguesia, fazendo com que a mesma se aliasse ao antigo regime, afogando as revoltas em sangue; a Revolução Russa de 1905 e 1917, da qual Trotski diretamente participou e já falaremos mais adiante; e da Segunda Revolução Chinesa de 1927, derrotada pela linha política adotada pela III Internacional stalinista.

A formação partiu compreender em que época histórica do capitalismo estamos, e para isso, retomou as elaborações de Lenin, de um pouco antes da Primeira Guerra, sobre o surgimento da época imperialista, sendo ela composta por cinco características centrais: a formação de monopólios em lugar da livre concorrência capitalista; o surgimento do capital financeiro (bancos) e o seu papel dirigente no capitalismo internacional, vindo da fusão do capital bancário com o industrial; a exportação de capitais para as colônias e semi-colônias, exportando indústrias e super explorando a mão de obra; a competição cada vez maior entre as potências imperialistas pela partilha do mundo e de mercados, acarretando em guerras; e o surgimento da aristocracia operária nos países imperialistas, ou seja, uma parcela do proletariado mais abastada, fruto de pequenas concessões dadas pelo imperialismo, que é possível apenas pela superexploração das colônias e semi-colônias, e na qual se apoiam a burocracia sindical e os partidos reformistas, como era na época a social-democracia. Essa época histórica, Lenin definiu como uma época de “crises, guerras e revoluções”, colocando a tarefa da revolução socialista e a tomada do poder pelo proletariado na ordem do dia.

O debate se torna mais complexo com as lutas políticas abertas que se davam na vanguarda russa. Uma velha potência em decadência, atrasada economicamente, com uma população camponesa de mais de 80%, diversos traços feudais e uma monarquia arcaica e aristocrática, assim era a Rússia tsarista no início do século XX. Quem iria resolver as tarefas democráticas da Rússia, que anteriormente foram resolvidas pela burguesia na Revolução Francesa, como a reforma agrária e a proclamação de uma República? Esse era o X da questão no Partido Operário Social-Democrata Russo, do qual inicialmente faziam parte tanto os bolcheviques quanto os mencheviques.

A teoria da Lei do Desenvolvimento Desigual e Combinado, também de Trótski, cai como uma coroa na compreensão da época imperialista, e foi fundamental para analisar a Rússia e as tarefas dos revolucionários. O desenvolvimento do capitalismo a nível internacional fez com que ele assimilasse para si as diferentes formas de produção pré-capitalistas, a exportação de capitais gerou nos países atrasados uma forte concentração do proletariado, como na Rússia era o caso de Moscou e Petrogrado, com fábricas de dezenas de milhares de operários. Esse desenvolvimento internacional do capitalismo competia à economia mundial um caráter objetivamente maduro para a revolução socialista, e dividia os Estados entre Estados opressores e oprimidos. Isso fez com que as burguesias nos países atrasados nascessem, por um lado, dependentes economicamente e politicamente dos capitais imperialistas, e por outro, espremidas pelo jovem e forte proletariado das cidades.

A experiência da Revolução Russa de 1905 mostrou que o proletariado, ao lutar contra a monarquia tsarista, ia para além e lutava também por suas demandas de classe, de expropriação e planificação da economia, ou seja, demandas diretamente socialistas. Para os mencheviques, incapazes de enxergar tal dialética nessa experiência revolucionária, acreditavam que, pelas tarefas da revolução serem democrático-burguesas, quem iria cumpri-las seria a burguesia liberal, e portanto, o papel do proletariado seria apenas de um mero suporte à luta da burguesia. A posição de Lenin, e nesse primeiro aspecto confluía com a de Trótski, partia de enxergar a incapacidade da burguesia em cumprir um papel progressista ou revolucionário, e ver o problema agrário como uma tarefa central da revolução. Entretanto, a divergência estava no papel dirigente ou não do proletariado em relação ao campesinato. Lenin formulava que a luta do proletariado em aliança com o campesinato pelas demandas democráticas (com o centro na questão agrária) daria origem à uma “ditadura democrática de operários e camponeses”, uma etapa “intermediária” rumo à ditadura do proletariado. Considerando o caráter heterogêneo, disperso e os interesses de propriedade não socialistas do campesinato (o que Marx já havia elaborado, e tanto Lênin quanto Trotski convergiam), conferindo-lhe uma incapacidade de formar um partido e um programa independente, o seu papel seria, ou apoiar o proletariado, ou apoiar a burguesia. Trotski, que, a partir dos balanços de 1905 defendia a ditadura do proletariado, acaudilhando as massas camponesas para o lado da revolução, explicava assim sua diferença com Lenin:

“A concepção de Lenin representou um enorme avanço na medida em que não partiu das reformas constitucionais e sim da mudança agrária como objetivo central da revolução e assinalava a única combinação de forças sociais que realmente poderia realizá-lo. O ponto fraco da concepção de Lenin, no entanto, estava na idéia inteiramente contraditória da “ditadura democrática do proletariado e do campesinato”. O próprio Lenin subestimava a limitação fundamental desta ditadura ao chamá-la burguesa. Com isto queria dizer que, em função de preservar sua aliança com o camponês, o proletariado, na revolução que se aproximava, teria que postergar a formulação direta dos objetivos socialistas. Mas isso teria significado a renúncia do proletariado à sua própria ditadura. Conseqüentemente a essência da questão residia na ditadura do campesinato, ainda que com a participação dos operários.”

Essas discussões são condensadas no texto de Trotski “As três concepções da Revolução Russa”.

A vitória da Revolução Russa, para os bolcheviques, em especial para Lenin e Trotski, estava diretamente ligada a uma batalha pela revolução internacional, em que um Estado operário na Rússia “em transição para o socialismo” (como caracterizava Trotski) seria um ponto de apoio fundamental no desencadear do processo revolucionário. A derrota da revolução alemã em 1918, e depois em 1923, entretanto, postergou conjunturalmente a tarefa da tomada do poder nos outros países, porém não estrategicamente. A Internacional Comunista se deteve, então, em elaborar táticas para o crescimento da influência dos Partidos Comunistas nas massas, se preparando para uma nova quebra no equilíbrio capitalista que possibilitasse a tomada do poder. Em seu quarto Congresso, em 1922, a IC também elaborou Teses para a luta revolucionária nas colônias e semi colônias, em que já enxergava o papel conservador e reacionário das burguesias nacionais, ainda que deixasse em aberto a antiga fórmula de Lenin de “ditadura democrática dos operários e camponeses”.

O isolamento da URSS, entretanto, levou ao fenômeno que ficou conhecido como “burocratização”, e deixou como consequência a ascensão do stalinismo, com uma nefasta política conhecida como “socialismo em um só país”, proclamando a construção do socialismo exclusivamente na URSS, visto que, para eles, a tomada do poder seria 90% da construção do socialismo. Nesse esquema, o papel da Internacional Comunista e do proletariado dos outros países seria de apenas impedir uma invasão militar à Rússia, e não a tomada do poder em seus próprios países para a expansão da revolução. Além disso, essa “teoria” estava acompanhada da divisão do mundo entre países “maduros” e “não maduros” para a revolução, deixando completamente de lado as elaborações de Lenin e Trotski sobre a formação do capitalismo em sua época imperialista, e renegando totalmente o internacionalismo proletário.

A generalização da TRP, condensada em suas Teses (que também foi base da bibliografia), se deu a partir da experiência da Segunda Revolução Chinesa, de 1927. A atrasada China, um países agrário e sequer unificado, viu sob seus olhos insurreições operárias em Xangai e Cantão, fortes polos urbanos e industriais. A linha do Partido Comunista Chinês e da Internacional Comunista, a essa altura já stalinizados por conta do processo de burocratização da URSS, justificada pela “teoria do socialismo num só país” de Stalin e Bukharin, foi de entrar no Kuomintang, partido da burguesia nacional, retomando a velha máxima menchevique de que seria necessária uma “etapa” de desenvolvimento capitalista, dirigido pela burguesia que cumpriria as tarefas democráticas, para apenas depois lutar pelo socialismo. Tal política levou ao massacre e à derrota física da revolução, que foi reprimida em unidade pelos Senhoras da Guerra (caracterizados pelos seus aspectos mais “feudais” e pré capitalistas) e a burguesia nacional. Ou seja, o proletariado demonstrou seu caráter de se colocar à cabeça da nação oprimida e resolver as tarefas democráticas do país atacando diretamente a propriedade privada, e a burguesia nacional mostrou seu caráter contrarrevolucionário, conferindo a dinâmica permanentista da revolução, ainda que pela negativa, por conta da derrota.

A partir dessas conclusões, Trotski e a Oposição de Esquerda intervieram em cada luta e debate para retomar a estratégia marxista revolucionária e dirigir as batalhas que o proletariado dava para a tomada do poder, acaudilhando as massas oprimidas. Essas batalhas, necessariamente se dariam em luta política contra todos os agentes que limitavam a luta da classe trabalhadora em seus objetivos, especialmente o stalinismo e o reformismo, que dirigiam também as principais burocracias sindicais internacionalmente.

Essa primeira parte da formação buscou apresentar e aprofundar à militância os principais fundamentos da Teoria da Revolução Permanente, com o intuito de fundamentar a vitalidade dos pilares do permanentismo desenvolvidos por Trotski para pensar a nossa época e a questão palestina.

Inúmeros debates e intervenções interessantes surgiram daí, sendo algumas delas: partindo da definição de Lenin sobre imperialismo e a aristocracia operária, como se formaram as burocracias sindicais em países coloniais e semicoloniais, e em especial na Palestina, onde a central sindical sionista Histadrut teve um papel central na divisão dos trabalhadores árabes dos judeus e hoje é um dos pilares do Apartheid. Outras intervenções foram no sentido de como a TRP apresenta uma saída estratégica também às opressões de raça e gênero, pois a burguesia se prova a cada momento incapaz de dar uma saída à essas questões, ainda mais em um país herdeiro da escravidão como o Brasil; enquanto por outro lado, a classe trabalhadora, em sua maioria negra e feminina (pelo menos no Brasil), em diversos momentos de sua luta, tomam para si as demandas do povo negro, das mulheres e LGBTQIAP+, e lutam por esses direitos democráticos com os métodos de luta da classe trabalhadora, como é o exemplo da juventude americana da Amazon e Starbucks que viu na sindicalização e nas greves um meio de lutar por direitos LGBTs ou pela legalização do aborto. E isso se liga também a uma defesa do marxismo enquanto teoria para a ação, contra as teorias pós-modernas e decoloniais que atacam o marxismo por supostamente não tratar do tema das opressões, mas acabam em uma estratégia de dissolver o sujeito social “classe trabalhadora”, que é quem pode ter o controle da produção e distribuição, em diversos outros sujeitos, sem apresentar uma alternativa estratégica para a superação do capitalismo, e adaptando-se ao Estado burguês e a variantes do reformismo.

Um debate que surgiu também, ligado ao tema da Palestina, foi a de como as tarefas por libertação nacional e retorno dos palestinos às suas terras, demandas essencialmente democráticas, são incapazes de serem cumpridas pela burguesia. Evidentemente, a burguesia sionista e imperialista não tem interesse nenhum em resolver a questão palestina, ao contrário, são os que neste exato momento estão realizando um genocídio. Israel busca expulsar os palestinos de Gaza. Entretanto, se analisarmos as burguesias árabes na região, seu papel sempre foi de se colocar contra a classe trabalhadora palestina em momentos mais aguçados de sua luta, e cumprem um papel de manter o Estado sionista de Israel na região.

Um exemplo disso é a relação que diversos Estados árabes estão tendo neste momento com Israel e o imperialismo, para negociarem os acordos que serão feitos no pós ofensiva de Netanyahu em Gaza. Historicamente, existem vários exemplos de colaboração da opressão palestina por parte dessas burguesias: a partilha da Palestina pela Jordânia e o Egito na guerra de 1967, ou as perseguições a palestinos refugiados na Síria, na Jordânia e no Líbano durante as guerras de 1948, 1967 e 1973. O Egito, a Jordânia, o Marrocos, os Emirados Árabes Unidos, e vários outros países árabes reconhecem Israel; a Arábia Saudita está em processo de reconhecimento. Muitas burguesias, com suas famílias dinásticas que estão no poder há décadas, foram instaladas pelo próprio imperialismo, como guardiãs dos interesses estrangeiros na região. Aceitaram as fronteiras nacionais impostas artificialmente depois da implosão do Império Turco-Otomano em 1918. Apesar das esperanças numa espécie de nacionalismo burguês pan-arabista, lançada pelo presidente egípcio Gamal Abdel Nasser na década de 1950, esse foi um fracasso completo e nenhuma força burguesa jamais avançou um passo na unificação independente do Oriente Médio, remodelando as fronteiras nacionais. Pelo contrário, preservaram essas fronteiras que servem justamente para impedir que os trabalhadores e os povos oprimidos da região se unifiquem para expulsar o imperialismo.

Mesmo dentro das frações burguesas na Palestina, verificamos a absoluta incapacidade para aproximar um programa que resolva a questão democrático-estrutural de expulsão do imperialismo. Isso é assim porque essas direções burguesas, mesmo aquelas vinculadas à luta armada contra o colonialismo terrorista de Israel, estão mais preocupadas em frear qualquer processo independente de massas na luta de classes no território palestino, do que em libertar a região do status colonial. O Fatah (organização criada por Yasser Arafat em 1959) passou a reconhecer Israel a partir dos Acordos de Oslo de 1993. O Fatah dirige a Autoridade Palestina, que colaborou abertamente com a expansão da colonização sionista na Cisjordânia, e é odiado pelas massas. O Hamas não reconhece Israel, mas é uma direção burguesa que controla a economia capitalista em Gaza desde 2007, e tem um programa teocrático reacionário de transformar a Palestina numa república Islâmica nos moldes do Irã (que financia o Hamas).

Essa situação dá completa razão às teses iniciais da TRP, segundo o Trotski: “Para os países de desenvolvimento burguês atrasado e, em particular, para os países coloniais e semicoloniais, a teoria da revolução permanente significa que a resolução íntegra e efetiva das suas tarefas democráticas e de libertação nacional somente pode ser concebida por meio da ditadura do proletariado, que se coloca à cabeça da nação oprimida e, primeiro de tudo, das suas massas camponesas. Sem a aliança entre o proletariado e os camponeses, as tarefas da revolução democrática não podem ser realizadas; nem sequer podem ser seriamente colocadas. Mas a aliança destas duas classes não poderá realizar-se a não ser através duma luta implacável contra a influência da burguesia liberal nacional”.

Nós marxistas sempre nos colocamos no campo militar do povo oprimido contra a nação opressora, e defendemos incondicionalmente a luta do povo palestino, apesar de suas direções tradicionais. Mas a guerra é um instrumento da política, e isso significa combater politicamente o programa das direções burguesas, inclusive daquelas que se encontram à cabeça do povo oprimido. Retomando Trotski, numa de suas reflexões sobre a China, uma colônia atacada durante a invasão japonesa em 1937: “Ao participar na guerra legítima e progressista contra a invasão japonesa, as organizações operárias devem manter a total independência política do governo [burguês nacionalista] de Chiang Kai-shek”. Essa tensão pela independência política, mesmo em meio à luta pela libertação nacional, não é um capricho de Trotski, e sim uma observação histórica de que as burguesias são incapazes de lutar contra o imperialismo para conquistar “íntegra e efetivamente” as reivindicações democráticas como a libertação nacional. Por isso as ditas "frente anti-imperialistas" que envolvem a burguesia por definição favorecem a sua hegemonia no interior do movimento de massas, e isso significa atacar os fundamentos da luta pela tarefas democráticas estruturais.

Por isso mesmo, está colocada a impossibilidade de uma solução de dois Estados: a existência do Estado sionista como um enclave imperialista na região depende da dominação e exploração do povo palestino. A atuação das burguesias árabes é de contenção da luta independente dos povos do Oriente Médio em geral, e do povo palestino em particular, contra a esturtura de dominação imperialista na região - luta essa substituída pela geopolítica dos interesses nacionais de cada Estado, com seus atritos e negociações. Diante disso, tem muita força a teroai da revolução permanente contra a colonização sionista. A luta da classe trabalhadora palestina e de todo o Oriente Médio (que se mobiliza por milhões contra o genocídio de Israel), em aliança com todos os demais setores oprimidos, poderia se desenvolver de forma implacável contra a dominação sionista quando ligada com uma política de independência de classe diante de todas as frações burguesas da região. Pensando numa dinâmica permanentista, e aproximando as visões de Trotski no século XX para pensar de maneira original a problemática palestina, podemos dizer que a luta pela libertação nacional da colonização sionista estaria conjugada diretamente com a luta contra a propriedade privada da burguesia israelense e imperialista, e não teria razão para se deter no meio do caminho, em uma etapa “intermediária”, “democrática”, na medida em que a mera existência democrática de um Estado palestino está obturada pela presença de Israel. Essa dinâmica de transcrescimento das tarefas democráticas (de libertação nacional) nas tarefas socialistas da revolução atingiria toda a região. Estaríamos diante de um ponto de apoio para a luta de toda a classe trabalhadora em todo o Oriente Médio.

Naturalmente, uma dinâmica expansiva da revolução, tratada nesses termos, encontraria obstáculos nas próprias burguesias árabes, para além da resistência desesperada do sionismo e dos EUA. A aliança entre os trabalhadores judeus que rompem com o sionismo, em todo o mundo, fundado na força comum dos trabalhadores e do povo pobre no Oriente Médio, teria de se chocar com a estrutura de dominação norte-americana que agregaria as oligarquias árabes contra a revolução (possivelmente se tornaram bastiões da intervenção burguesa na Palestina, o que por sua vez teria de se haver com prováveis rebeliões de massas em seus próprios territórios). Esse debate rendeu, também, importantes aprofundamentos na discussão teórica e estratégica com o morenismo, em especial a LIT/PSTU, que com a teoria da “revolução democrática” rompe com o permanentismo de Trotski, levantando uma estratégia semi-etapista para a Palestina com um programa ilusório sobre uma Palestina livre, democrática e não racista dentro do esquema de domínio atual, sem ameaçar a propriedade capitalista. Essa separação da estratégia socialista diante das tarefas democráticas não é nova no morenismo. Efetivamente, é a mesma separação entre as tarefas democrático-estruturais e o programa socialista que o PSTU desenvolveu na Primavera Árabe, de 2010-11, que levou essa organização a apoiar todas as oposições burguesas pró-imperialistas aos governos autoritários, frações burguesas que facilitaram e dirigiram a repressão que levou à derrota sangrenta daqueles processos. Podemos dizer que a derrota dos processos revolucionários da Primavera Árabe foram decisivos para que a Palestina seguisse sendo uma colônia. Essa separação, portanto, implica abandonar, na prática, a luta pela resolução “íntegra e efetiva” das demandas democráticas de massas mais importantes no caso da Palestina, integradas dentro dos objetivos de libertação nacional: desde as mais elementares como o cessar-fogo imediato e a expulsão das tropas israelenses de Gaza e da Cisjordânia, até a questão da garantia do direito de retorno ao território histórico da Palestina de todos os familiares de exilados em suas muitas gerações, ou mesmo a reconstituição física do território histórico palestino, que só poderia se dar mediante o desmantelamento do artificial Estado de Israel, como condição da convivência pacífica entre árabes e judeus.

Essa formação é parte de preparar a militância para os próximos passos e intervenções de nossa organização na luta de classes nacional e internacionalmente, seja nas distintas situações que atravessam a conjuntura brasileira com a Frente Ampla de Lula-Alckmin, semeando no progressismo de que seria possível resolver as questões mais elementares do Brasil através de uma aliança com a burguesia nacional; seja na luta palestina, em que no mundo todo estão ocorrendo manifestações em solidariedade, contra o genocídio. Nós da FT-QI no Brasil e no mundo somos parte de construir nas distintas frentes, comitês e unidades de ação que se desenvolvem para enfrentar o banho de sangue que o sionismo e o imperialismo estão fazendo. Essa luta pela frente única operária em solidariedade à Palestina passa, no Brasil, pela exigência às centrais sindicais de que saiam de sua paralisia, e convoquem manifestações em todo o país contra o genocídio em Gaza, já que somente nas ruas e com os métodos de luta se poderia enfrentars seriamente as bravatas da extrema direita bolsonarista e do sionismo, e impor imediatamente a ruptura de relaçoes diplomáticas e comerciais entre Brasil e Israel.

A teoria da revolução permanente goza de boa saúde, e o terreno da Palestina e do Oriente Médio é um exemplo de sua vitalidade.




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