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Rumo ao V Congresso do MRT | O caminho da unificação das lutas pela base em São Paulo para derrotar os ataques sem conciliação

Com as novas delações de Mauro Cid, o governo Lula-Alckmin avança em conquistar mais estabilidade em base a uma relativa melhora econômica - que se fundamenta na manutenção das reformas anti-operárias - e na amplitude das alianças com o Centrão. Lula relembra a todos o DNA do PT na administração dos assuntos capitalistas: incorporou dois bolsonaristas na Esplanada dos Ministérios, nas pastas do Esporte e de Portos e Aeroportos, um deles André Fufuca do PP (que votou a favor do golpe institucional, e também a favor do Marco Temporal contra os indígenas) e o outro Sílvio Costa Filho, do Republicanos, partido do privatista governador de São Paulo Tarcisio de Freitas, de Damares Alves e de Mourão. Apoiado na expectativa das massas de melhora e reconstrução de um país devastado pelo odioso bolsonarismo, o governo Lula conta com o papel das burocracias sindicais para conter os processos de luta que começam a se expressar, para que não levem até o final a sua potencialidade. Mas se entra em cena a classe trabalhadora, de forma unificada, o script deste controle burocrático pode ser fortemente questionado.

Diana AssunçãoSão Paulo | @dianaassuncaoED

terça-feira 26 de setembro de 2023 | Edição do dia

Enquanto Lula se postula como liderança internacional, no Brasil aprofunda todos os caminhos da conciliação de classes que abriram espaço à odiosa extrema direita bolsonarista. Aos 7 anos do golpe institucional vemos as instituições deste regime político se fortalecerem como árbitros da vida da população. Neste momento, ministros do STF, que naquele então foi um pilar da destituição de Dilma para que Michel Temer pudesse encabeçar a reforma trabalhista que os patrões tanto queriam, e que depois foram decisivos para a prisão arbitrária de Lula, dizem que essa prisão foi o maior erro da história. Buscam “limpar” os desmandos completamente autoritários que utilizaram para beneficiar os capitalistas sedentos de lucro, que precisam arrancar do couro do trabalhador destruindo nossas vidas e fazendo com que trabalhemos até morrer. Mas sobre todas essas reformas que seguem intactas o STF não fala absolutamente nada, atuando para preservá-las.

Por outro lado,Lula, ao mesmo tempo em que fez festa na ONU junto ao imperialista Joe Biden pelo lançamento da chamada "Parceria pelos Direitos dos Trabalhadores", mantém a retirada de direitos básicos dos trabalhadores com a nefasta reforma trabalhista, que no Brasil implica trabalho intermitente, informalização e alta precarização de todas as formas de trabalho. Reforma trabalhista, reforma da previdência, lei da terceirização irrestrita. Todas se mantêm tornando um inferno a vida da classe trabalhadora, em particular dos trabalhadores e trabalhadoras negras, quando no caso da terceirização se trata diretamente de uma porta de entrada ao trabalho semiescravo - como vimos nas vinícolas do Rio Grande do Sul que agora recebem dezenas de milhões em isenções do governador Leite.Sobre essa obra do golpe institucional, o governo já se comprometeu com o conjunto dos setores capitalistas que o apoiam: não serão revogadas.

E não apenas, o governo agregou a essas reformas um novo teto de gastos com o nome de Arcabouço Fiscal, um mecanismo que inclusive facilita as privatizações ao deixá-las fora do teto, e irá precarizar ainda mais a vida da população ao limitar os gastos com serviços básicos como saneamento, moradia e transporte para garantir o pagamento da dívida pública, uma verdadeira bolsa banqueiro. Se os primeiros sinais de melhora na situação econômica dão uma sensação de alívio em alguns setores da classe trabalhadora, que estão neste momento com aspirações mais elevadas do que no momento trágico da pandemia e do governo Bolsonaro, mais ainda é necessário demonstrar que estas políticas de conciliação e atrelamento com o capital financeiro servirão apenas para descarregar a crise nas nossas costas. Por isso, na política, o governo Lula-Alckmin pode indicar um reacionário para o STF como Cristiano Zanin e dizer que “o voto do STF deve ser secreto”, o que isentaria esses juízes milionários eleitos por ninguém de sequer explicar para a população seu voto sobre questões que dizem respeito à vida de milhões de pessoas. Ou então entregar para um partido como o Republicanos, aliado de Bolsonaro, e do governador privatista Tarcísio de Freitas, um Ministério em seu governo.

Que o partido de Tarcísio tenha um Ministério no governo Lula-Alckmin é todo um símbolo da Frente Ampla. Isso porque Tarcísio neste momento declarou guerra contra a classe trabalhadora em São Paulo. Se propôs a levar adiante o mais audaz plano de privatização dos bastiões do serviço público: o metrô, os trens e a água. Quer enriquecer os grandes empresários paulistas e mostrar serviço para se alçar como a nova extrema direita rumo a 2026. Justo em meio a esse ataque, Lula havia articulado evento de lançamento do PAC em SP com Tarcísio de Freitas, o que só desmarcou por problema de saúde, e está negociando novos acordos. Um retrato também de como a conciliação do governo Lula-Alckmin abre o caminho para figuras como Tarcísio de Freitas.

Neste cenário o governo Lula-Alckmin fagocitou uma parte importante da esquerda. Se em 2002 no primeiro governo Lula vimos um processo de rupturas com o PT pela esquerda, que inclusive deu origem ao PSOL, agora é todo o contrário. O PSOL está cada vez mais integrado ao governo, compondo um Ministério na mesma Esplanada que abriga ministros do… PP e do Republicanos! Com um discurso de “pressionar o governo à esquerda” também utilizado por parte da intelectualidade e militância petistas, a estratégia é de que o governo estaria em disputa, de que Lula está emparedado pela “governabilidade” e que precisa tomar medidas para governar porque “essas são as regras do jogo” e que justamente o papel a se cumprir por parte da esquerda e dos movimentos sociais é o de “pressionar”. Mas a verdade é que Lula está atuando junto com a base que sustentou o bolsonarismo no Congresso, como o partido de Lira (que confirmou que dará maioria ao governo), e tem aprovação crescente nos mercados financeiros devido aos ajustes como o Arcabouço. Assim, retoma o que historicamente o PT transformou em prática: há uma “divisão de tarefas” entre a “política institucional” e a “política dos movimentos sociais”, como se o que Lula e os parlamentares fizessem não tivesse a ver com o que depois as direções sindicais e os movimentos sociais fazem no dia a dia, e vice-versa, ou seja, como se não fossem duas partes de uma mesma estratégia.

Dentro do PSOL, claro, há nuances e debates sobre essa política. Trata-se de um partido que se dividiu em relação ao golpe institucional, com figuras que comemoraram a Lava Jato como Luciana Genro, mas também com toda uma ala que hoje está se preparando para uma campanha atrelada aos empresários paulistanos com Guilherme Boulos como candidato a prefeito, que recentemente esteve em evento da FIESP para apresentar sua candidatura. E há também os que são “mais lulistas do que Lula”, como a Resistência, que atua para encobrir pela esquerda a política de Lula. Esse partido, ainda assim, segue como referência para milhares de jovens e trabalhadores que queriam uma alternativa à esquerda do PT e ficam órfãos diante deste atrelamento do PSOL ao governo e sua submissão a estas políticas, que fez com que o PSOL por exemplo não tenha movido nenhuma força para enfrentar, na luta, o novo teto de gastos do próprio governo que faz parte.

Os trabalhadores e estudantes de São Paulo mostram o caminho

Neste marco, é um alento muito importante a situação de mobilização em São Paulo, que desponta como um foco de lutas que podem antecipar uma tendência nacional de mobilizações por recomposição frente aos ataques dos anos anteriores, ou de lutas defensivas diante dos novos ataques de governadores estaduais. Em São Paulo, depois de quase uma década, os estudantes da USP estão em uma forte greve contra a precarização da universidade exigindo a contratação de professores para poder estudar, denunciando como a USP está buscando se preparar também para as novas regras do Novo Ensino Médio, que quer um futuro empreendedor para a juventude, enquanto Lula aprofunda sua parceria com instituições como a Fundação Lemann, articuladora desse ataque. Mas, principalmente, em São Paulo, diante do feroz ataque privatista de Tarcísio de Freitas, os metroviários, sabespianos e ferroviários da CPTM estão demonstrando disposição de luta para enfrentar este ataque histórico, votando uma greve unificada para o dia 03 de outubro. São Paulo vai mostrando o caminho da luta de classes para enfrentar os ataques.

Neste processo, entretanto, se expressam muitas estratégias de atuação no movimento operário que mostram diferenças fundamentais no que diz respeito à auto-organização, à batalha pela hegemonia operária e ao combate às burocracias sindicais na luta pela Frente Única Operária. A última assembleia do Sindicato dos Metroviários de São Paulo foi categórica em mostrar duas estratégias para a luta de classes e para o movimento operário. A decisão de uma greve unificada de 24 horas para o dia 3 de outubro foi uma grande conquista dos trabalhadores das 3 categorias, mas a forma de avançar na luta, na unidade e na organização pela base dos trabalhadores é que sejam os próprios trabalhadores que decidam se a greve deve ser de apenas 24 horas ou se ela deve seguir, e quais devem ser os próximos passos dessa luta. Na Assembleia dos metroviários, o PSTU e a Resistência, que atuam cada vez mais como um bloco na Diretoria do Sindicato rememorando os velhos tempos em que militavam juntos como PSTU, antes da divisão do partido, explicitaram sua estratégia: a unidade é fruto de conversas e boa relação com os dirigentes sindicais da Sabesp e da CPTM, em reuniões diplomáticas independente da força da base. Argumentam que se, para além do que acordado nessas reuniões, forem aprovadas medidas “por baixo”, pela base, “tudo pode estar perdido”, que não há possibilidade de um processo de luta que vá além da política da burocracia, e que até mesmo a tentativa de apontar nessa direção poderia levar a não ter greve nenhuma. Assim, disciplinados à burocracia, atuam juntos para garantir que mesmo em um Sindicato dirigido por correntes de esquerda nada saia do “script” da burocracia sindical - esta sim, que pode recuar e fazer tudo se perder.

Do outro lado, nós do MRT defendemos que era fundamental avançar na unidade da greve unificada do dia 3 conforme se chegou em acordo entre os 3 sindicatos, exigindo dessas direções que estejam na luta, impulsionando a organização dos trabalhadores, mas que as decisões não podem ficar pré-estabelecidas por acordos de cúpula, e sim devem ser fruto da democracia dos trabalhadores, pela base. Que temos que garantir que seja a base, em uma assembleia unificada, que decida a possibilidade de a greve seguir para além das 24 horas, e no caso inclusive de essa assembleia não acontecer, que os metroviários façam sua própria assembleia para definir seus próximos passos. O resultado dessa votação foi uma grande vitória da organização pela base: a exemplar defesa dos metroviários do Movimento Nossa Classe, Marília Rocha e Felipe Guarnieri, de chamado a uma Assembleia Unificada, venceu com 760 votos, apesar da defesa contrária dos membros do PSTU e da Resistência que pediam para garantir a subordinação da luta aos limites da vontade da burocracia sindical expressa nas negociações. São duas estratégias para o movimento operário e para a luta de classes.

Este tipo de situação evidencia que as discussões sobre Frente Única Operária sofrem inúmeras deturpações por parte das correntes que buscam uma relação diplomática com as burocracias por fora de mover uma força material a partir da base para impor a frente única. Consideram que o que impõe a unidade são suas palavras nas reuniões, se considerando “ótimos negociadores”, por fora da força da classe trabalhadora. Mas é o poder de decisão da base que pode garantir que a greve se efetive e vá até o fim, apesar das vacilações das direções - como vemos no caso da direção da UGT na CPTM, que a imprensa noticiou que, logo depois de sua assembleia, já declarou que “até a data, dependendo das sinalizações do Governo do Estado, a greve pode ser cancelada”. Nossos esforços estão concentrados no objetivo de fortalecer a organização de base da classe trabalhadora para avançar nas medidas de unidade entre os sindicatos, mas sem nenhuma ilusão nas direções burocráticas. Por exemplo, na categoria de professores, como parte da Oposição Combativa Unificada publicamos uma exigência a que a Apeoesp organize os professores para uma paralisação também no dia 03 de outubro, se unificando com metroviários, sabespianos e ferroviários. Na Subsede da Apeoesp de Santo André, coordenada pela professora Maíra Machado do Nossa Classe, os Representantes de Escola reunidos votaram esta exigência se apoiando também na Carta de Santo André com mais de 700 assinaturas de professores que exigiam da Direção do Sindicato- APEOESP (PT, Resistência, MES e PCB) um plano de luta concreto que não existe até o momento. Da mesma forma no Sindicato dos Trabalhadores da USP se votou uma paralisação para o dia 3 de outubro.

Para avançar nesta perspectiva, estamos batalhando também por um Comando de Greve unificado com representantes eleitos pela base nas assembleias de cada categoria em luta, para fortalecer e coordenar a luta com a auto-organização dos trabalhadores pela base. Poderia ser um primeiro passo nessa direção, a formação de um comando de greve deste tipo no Metrô de São Paulo, levando adiante a batalha pela unidade com as outras categorias em base ao chamado à Assembleia Unificada. Da mesma forma seria um passo muito importante avançar em um Comitê Unificado para coordenar efetivamente as lutas, que possa unificar os estudantes da USP com os metroviários e as outras categorias de trabalhadores, que poderiam no dia 3 se unificar em uma grande manifestação de rua para enfrentar o governo Tarcísio. Essas seriam formas de avançar para colocar de pé uma verdadeira greve geral contra as privatizações de Tarcísio no dia 3.

Também estamos dando uma batalha no movimento estudantil para que o dia 3 se transforme em um dia nacional de lutas,batalhando por paralisações em outros estados que levantem apoio às lutas de São Paulo em conjunto com suas demandas. Foi o que já foi aprovado em uma reunião de 14 entidades da UERJ(levantando também a pauta da permanência estudantil e por justiça para as vítimas da violência do estado) e também na UFABC, mas é importante que todas as organizações da esquerda se unifiquem na luta por transformar o dia 3 numa jornada nacional.

Como fica claro, neste processo, ao passo que batalhamos para construir na linha de frente a mobilização, é necessário debater as diferentes estratégias no movimento operário e na juventude para desenvolver a luta. Isso se combina à batalha em distintos terrenos, como na intelectualidade, disputando contra as ideias dominantes e também no que diz respeito à batalha contra o racismo e a violência policial, como fizemos com um importante ato no Rio de Janeiro organizado junto às Mães de Manguinhos, que reuniu 300 pessoas e 65 familiares de vítimas da polícia, em um momento em que governos reacionários como de Cláudio Castro protagonizam massacres contra a população negra, e também quando vemos governos do PT como Rui Costa na Bahia levando adiante inúmeras chacinas. Com o Esquerda Diário e a ampliação de nossa difusão nas redes sociais e nas Edições ISKRA, e com importante avanço da Juventude Faísca Revolucionária, que no Congresso da UNE mostrou sua diferença em relação a todas as correntes que se adaptam a burocracia governista. Todas essas iniciativas fazem parte de como encaramos as batalhas e hipóteses de quais são as vias para emergir um verdadeiro partido revolucionário no Brasil, que integram a nossa batalha internacionalista pela reconstrução da IV Internacional, em um momento no qual na Argentina damos uma forte batalha pelas ideias revolucionárias com a candidatura a presidente de Myriam Bregman e Nicolas Del Caño pela Frente de Esquerda e dos Trabalhadores - Unidade.

Rumo ao V Congresso do MRT, que tem documentos públicos sobre a situação internacional e nacional, viemos debatendo com inúmeros jovens e trabalhadores sobre a necessidade de colocar colocar de pé um partido revolucionário internacionalista no Brasil que coordene e seja ferramenta da auto-organização da classe trabalhadora junto com às mulheres, negros, indígenas e LGBTs para superar pela esquerda a experiência do PT, a burocracia sindical e a experiência stalinista, enfrentando este governo de frente ampla para derrotar todos os ataques e também a extrema direita que sobrevive graças à conciliação. É este o caminho, o da luta de classes, que pode colocar a classe trabalhadora na rota da luta pela revolução operária e socialista, de um socialismo organizado pela base que abra espaço ao comunismo.




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