O presidente do Conselho de Ética, deputado José Carlos Araújo (PSD-BA), sorteou os deputados Zé Geraldo (PT-PA), Vinícius Gurgel (PR-AP) e Fausto Pinato (PRB-SP) para compor a lista tríplice de onde ele escolherá o relator do processo por quebra de decoro parlamentar contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
quarta-feira 4 de novembro de 2015 | 00:00
Eduardo Cunha é acusado de ter mentido à CPI da Petrobras ao negar que possuía contas no exterior. Posteriormente, a pedido da Procuradoria-Geral da República, um inquérito foi aberto no Supremo Tribunal Federal (STF) para apurar se contas atribuídas a Cunha na Suíça foram abastecidas com propina do esquema de corrupção da Petrobrás investigado na Operação Lava Jato.
Não puderam participar do sorteio deputados do mesmo Estado, partido e bloco partidário de Cunha. Com isso, além do presidente, ficaram de fora os deputados peemedebistas Washington Reis (RJ) e Mauro Lopes (MG).
Araújo pediu ao deputado Júlio Delgado (PSB-MG) que não participasse do sorteio para evitar que Cunha utilize sua eventual indicação para contestar o conselho, já que Delgado foi seu adversário na disputa pela presidência da Câmara. "Para preservar vossa excelência, este conselho e a mim, faço este apelo", disse o presidente do colegiado. "Vou atender o apelo de vossa excelência", disse Delgado. "Não tenho qualquer tipo de constrangimento. O pedido aposto à Corregedoria pedindo o afastamento do presidente foi subscrito por mim. Pelo princípio da celeridade processual, vou atender ao pleito de vossa excelência", respondeu o deputado do PSB.
Os deputados Cacá Leão (PP-BA), que caiu do cavalo, e Wladimir Costa (SD-PA), que está com problemas de coluna, não participaram por estarem de licença médica. Com isso, apenas 15 parlamentares participaram do sorteio.
A decisão abre espaço para que deputados aliados e integrantes de partidos próximos a Cunha participem do sorteio, ampliando as chances de um parlamentar pró-Cunha assumir a relatoria. A decisão poupa da restrição nomes de PTB (1), PP (2), PSC (1), PRB (1), DEM (1) e Solidariedade (1). A escolha de um relator favorável é crucial para Cunha, pois será ele quem apresentará o texto a ser votado pelo colegiado.
O chefe da burocracia sindical da Força Sindical e do partido Solidariedade, o "Paulinho da Força", já demonstrou apoio a Cunha e buscará integrar o Conselho de Ética para "agraciar o perdão" a seu comparsa.
O andamento do processo contra Cunha no Conselho de Ética mostra a falência dessa instituição, assim como de todo regime político burguês. Dos 15 deputados possíveis de serem sorteados para a relatoria do processo, 6 eram de partidos próximos do presidente da Câmara. Conjuntamente, eles vêm implementando medidas do ajuste fiscal e impulsionando pautas reacionárias contra os direitos das mulheres, como o PL 5069, de co-autoria do presidente do PT de Rondônia, Padre Ton. Não se pode silenciar esta cumplicidade do PT com toda a direita tradicional, como faz a esquerda como o PSTU, e principalmente MTST e PSOL, unidos paraliticamente ao governo Dilma e às burocracias nefastas da CUT e da UNE na Frente Povo sem Medo.
Enquanto a politicagem rasteira dos patrões segue a preparação das eleições de 2016 e 2018, seus principais porta-vozes entendem o momento da maneira como expressou Olavo Machado Junior, presidente da Federação das Indústrias de Minas Gerais: "Não sou a favor de impeachment. Acho que grande parte dos empresários não é. Estamos alinhados com ela [Dilma] para ter solução." Com este viés, Cunha sabe dos limites de suas ameaças e quer se garantir.
O interesse desses deputados não é cassar o mandato de Cunha, nem dar exemplo de moralidade diante das denúncias referentes às contas milionárias na Suíça, mas sim preservar a estabilidade das instituições burguesas durante a aplicação dos ajustes, como pediram distintos setores da patronal industrial e agrária neste final de semana, prontamente atendidos pelo PMDB no projeto neoliberal "Uma ponte para o futuro", de Michel Temer.
Também não podemos imaginar que partidos que dizem estar mais longe de Eduardo Cunha tenham interesse em levar a cassação do deputado até as últimas consequências. O orçamento do país, direcionado por Dilma e Joaquim Levy para abastecer banqueiros e especuladores da dívida, depende em grande parte do Congresso. A tramitação no Legislativo das medidas do ajuste fiscal (que garantem o pagamento da dívida) e a derrubada das pautas-bomba (as que implicam em aumento das despesas do Poder Executivo) tem em Cunha uma peça-chave. Em nada interessa aos deputados petistas, comprometidos em levar a cabo o ajuste promovido pelo seu governo, a cassação de Cunha, pois perderiam um aliado na implementação de seus ataques aos trabalhadores.
Embora esta decisão esteja subordinada às condições políticas que mudam ininterruptamente, por ora a nenhum partido burguês interessa a cassação de Cunha. Enquanto representantes dos patrões, os deputados estão unidos para preservar as instituições atuais e descarregar os custos da crise sobre os trabalhadores, as mulheres e a juventude, através do ajuste fiscal. Cunha é um fiel adepto deste programa, compartilhado pelo PT e pelo PSDB. Apenas a mobilização destes setores, de forma independente, pode barrar a precarização das condições de vida e os ataques de Cunha e de Dilma.
Apesar de cenários imprevistos poderem ocorrer em função da luta de bastidores dos políticos burgueses, em defesa de sua eterna impunidade, as negociatas entre Lula e Cunha mostram que a operação política por trás do "Fora Cunha" que vem levantando setores governistas, acompanhado pela Frente Povo sem Medo, tem como objetivo poupar os principais agentes do ajuste em curso.
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