×

Racismo | Eu não quero falar de futebol

Nos solidarizamos com Vini Jr, sua família, amigos, todos e todas imigrantes na Europa e todos os povos não-brancos do mundo inteiro que compartilham diariamente a dor do racismo e xenofobia. Por isso, compartilho essa crônica com vocês!

Renato ShakurEstudante de ciências sociais da UFPE e doutorando em história da UFF

segunda-feira 22 de maio de 2023 | 14:19

Foto: Alberto Saiz / AP

“Eu não quero falar de futebol!” Foi essa a resposta que Carlo Ancelotti deu quando uma
repórter após a partida entre Real Madrid e Valencia, quando ela perguntou como ele se sentia após perder dois jogos importantes, um atrás do outro.

E não era pra menos, Vini Jr foi xingado e hostilizado pela torcida rival quase o jogo inteiro, foi chamado de macaco, provocado a todo momento pela torcida e pelos jogadores que inclusive o agrediram durante a partida. A resposta do juiz foi expulsá-lo, por supostamente causar confusão. Nada mais “normal” nas regras do racismo: provocar um negro com ofensas racistas a ponto revoltá-lo para depois lhe punir.

Um outro repórter perguntou pra Vini após o jogo, se ele iria se desculpar por ter supostamente “ofendido” a torcida do Valencia fazendo o número 2 com as mãos em alusão a história daquele time na 2ª divisão.

Vini só conseguia sorrir inconformado e incrédulo de que aquele repórter não conseguia entender o tamanho daquelas ofensas. Atrás de um jogador negro inconformado, uma dor irremediável, porque quando nos xingam de macaco, nos dói na alma. Imaginem a dimensão disso para um jogador de futebol que lida com esse tipo de coisa e se revolta com essa situação faz quase 2 anos.

Não é possível que a imprensa após o jogo queira falar de futebol. Não é possível tamanha naturalização de algo tão detestável e nojento como é o racismo a ponto de um repórter perguntar se a vítima irá se desculpar.

Assim como Vini e Ancelotti dizemos, hoje não quero falar de futebol!

Quero falar do que mais nos angustia e sentimos na pele. Quero falar da xenofobia e do racismo vivido por milhões de imigrantes árabes e africanos que arriscam suas vidas nas travessias perigosas para Europa. Que tem a triste imagem de um bebê sírio morto afogado socorrido na Turquia em 2015 tentando chegar à Grécia com sua família, como a realidade de milhões de trabalhadores que perdem suas vidas e deixam seus países de origem fugindo da guerra.

Eu já disse que não vou falar de futebol, porque eu quero falar da Coroa espanhola, uma decrépita, reacionária e racista casta de parasitas que alimenta com toda sua pompa e hábitos, atitudes detestáveis como essa que ocorreu na partida entre Valencia e Real Madrid. Uma família que enche de orgulho e dá risadas quando vê pessoas como Vini Jr sendo menosprezadas e humilhadas por conta da sua cor. Uma família que carrega nas suas costas centenas de milhões de assassinatos contra povos originários e contra negros escravizados, mas que certamente um dia vai pagar por isso.

Quero falar do Estado Espanhol que estimula o racismo quando têm uma política migratória onde trata os refugiados e imigrantes como sub-humanos assim como sua Coroa sempre tratou os africanos escravizados e os indígenas da Américas! Não podemos naturalizar a imagem de milhares de marroquinos chegando a nado a Ceuta para trabalhar em postos de trabalhos precários, sem direitos e a todo momento sendo vítimas da violência policial e racista. Isso também nos dói na alma.

Como disse Vini em sua redes sociais, infelizmente hoje o Estado espanhol se apresenta como um país racista, não por conta dos trabalhadores e do povo que repudia esse tipo de coisa, mas pela naturalização e estímulo à prática racista que a La Liga, a Confederação de Futebol espanhol, o próprio estado, a imprensa burguesa e sua coroa degenerada fazem questão de transmitir.

E alertamos para aqueles que ainda não se livraram das opressões contra seus irmãos: o racismo é uma ideologia da classe dominante e não a nossa!

Apesar disso tudo, o que fica para o mundo inteiro é a imagem de que Vini Jr não está sozinho. As expressões de solidariedade de clubes de futebol, jogadores, artistas e as manifestações nas redes sociais mostram que amplos setores não toleram mais coisas como essa.

Vini não está só, porque também está com os imigrantes, os terceirizados, os jovens das periferias francesas, os marroquinos que sonham um dia entrar na Europa, os senegaleses, a geração Union dos Estados Unidos, os brasileiros, o povo mapuche e todos e todas que se solidarizam quando um irmão sofre preconceito racial.

Só um sistema tão decrépito e covarde como o sistema capitalista que não aceita a nossa cor e a nossa origem para naturalizar algo tão deplorável como o que aconteceu com Vini no jogo de ontem.

Enquanto não acabarmos com o racismo e capitalismo, não vamos falar de futebol…




Comentários

Deixar Comentário


Destacados del día

Últimas noticias